O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

O Arcabouço Fiscal acabou-se?

Publicado em 23/09/2024 às 13:48

Alterado em 23/09/2024 às 13:48

O Ministério do Planejamento enviou ao Congresso na sexta-feira o relatório avaliação de receitas e despesas primárias do 4º bimestre. Ao contrário dos últimos bimestres, houve grande perda na composição das receitas esperadas. Já a composição da despesa sofreu somente pequenas alterações. Assim, o governo deve publicar um decreto de reprogramação financeira no dia 30/09, para efetivar as revisões contidas no relatório.

Mas a diluição dos planos de reforço da receita, para sustentar o Arcabouço Fiscal assustou o mercado financeiro na sexta-feira, com forte alta do dólar (+1,55%) que fechou a R$ 5,5103, após mais de uma semana de baixas. Mas a desconfiança prosseguiu nesta segunda-feira, com o dólar abrindo a R$ 5,5204, e escalando até R$ 5,5982, com refluxo para R$ 5,5385 às 12:45, com valorização de 0,39%.

Focus prevê juro maior em 2024 e 2025

O pior veio das projeções de altas dos juros para 2024 e 2025 na Pesquisa Focus, encerrada no dia 20, já com as respostas apresentadas antes da revisão orçamentária, e divulgada hoje pelo Banco Central. A mediana das previsões do IPCA por 145 respostas aumentou de 4,35% para 4,37% e as respostas de 97 instituições nos últimos cinco dias úteis apontaram 4,40%, roçando o teto da meta de inflação, de 4,50%. Para 2025, o IPCA subiu de 3,95% para 3,97% (4,00% nas respostas dos últimos cinco dias úteis).

Em função disso, mesmo com as projeções do dólar ficando estáveis em 2024 (R$ 5,40) e 2025 (R$ 5,35), o mercado elevou de 11,25% (que era a posição do Bradesco) a mediana das apostas da Selic em dezembro, para 11,50% e as respostas dos últimos cinco dias para 11,75% (a posição do Itaú). Já os juros para 2025 ficaram estáveis em 20,50% nas respostas da mediana do mercado, mas as projeções dos últimos cinco dias úteis apontaram alta para 10,75%.

Arcabouço abalado

Na reavaliação do Ministério do Planejamento e Orçamento, p contingenciamento de despesas discricionárias de R$ 3,8 bilhões será revertido a zero, já que foram incluídas receitas extraordinárias nas projeções. Entretanto, o bloqueio de despesas discricionárias de R$ 11,2 bilhões será aumentado em R$ 2,1 bilhões (para R$ 13,3 bilhões), para atenuar o problema de subestimação das despesas obrigatórias. Assim, o resultado primário projetado, excluídas as despesas extraordinárias (RS e queimadas), passou de -R$ 28,8 bilhões (limite mínimo da meta de primário) para -R$ 28,3 bilhões.

Mas o destaque da revisão, que frustrou expectativas no mercado financeiro e fez crescer as dúvidas sobre a sustentabilidade do Arcabouço Fiscal, ocorreu na composição esperada da receita. A expectativa de arrecadação relacionada ao CARF (R$ 56 bilhões estimado em maio) passou de R$ 38 bilhões no relatório do 3º bimestre para R$ 847 milhões no relatório do 4º bimestre. Ou seja, com as novas projeções já é possível afirmar que as receitas relacionadas ao CARF, em 2024, foram um fracasso.

Mesmo as esperadas receitas de Transações Tributárias, originalmente estimadas em R$ 43 bilhões, que encolheram para R$ 23 bilhões em julho, murcharam para apenas R$ 15 bilhões na avaliação de 20 de setembro. Ou seja, da arrecadação total de R$ 168 bilhões estimada em maio, sendo R$ 56 bilhões do Carf e R$ 43 bilhões de transações tributárias (acertos com a Receita), que totalizavam R$ 99 bilhões, a realidade sumiu com R$ 83 bilhões, ou seja, quase metade (49,4% da estimativa original). Vale ressaltar que a incerteza de receitas com essas duas medidas era destacada por quase todos os analistas, desde o fim do ano passado. A rigor, o grande acordo foi com a Petrobras. Nas pendências com o setor privado houve pouco avanço.

Dificuldades com as revisões

Para compensar essa perda de receitas, foram acrescentados os impactos esperados com as medidas extraordinárias aprovadas para compensar a desoneração da folha: apropriação de R$ 6,3 bilhões referentes valores de depósitos judiciais e extrajudiciais empoçados na CEF, apropriação de R$ 8 bilhões referentes a depósitos em bancos sem identificação de CPF ou CNPJ e recebimento de R$ 4 bilhões referentes a refinanciamento de multas de agências reguladoras. Já a expectativa com dividendos de estatais aumentou em R$ 10,1 bilhões, com os dividendos extraordinários referentes ao BNDES.

Após os ajustes entre as rubricas, a receita total teve aumento de R$ 2 bilhões, enquanto as transferências se reduziram em R$ 2 bilhões, levando a um aumento da receita líquida de R$ 4 bilhões.

Do lado dos gastos, a LCA Consultores aponta “o problema de subestimação de despesas obrigatórias, presente desde a versão inicial do projeto orçamentário. No relatório do 4º bimestre, o governo deu mais um passo em direção ao realismo, com mais uma revisão das despesas previdenciárias, que passaram de R$ 923 bilhões para R$ 935 bilhões”. A consultoria ainda vê “subestimação provável de cerca de R$ 5 a 8 bilhões nessa rubrica, a menos que haja rápida efetivação (no último trimestre) das medidas anunciadas de pente-fino dos benefícios do BPC e do Seguro-desemprego, aposentadorias por invalidez e licença médica do INSS. Com dificuldades nessas clivagens, a LCA acha possível “mais um ajuste no relatório do 5º bimestre”.


OLM

 

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