O dilema dos juros na super 4ª feira
O mundo financeiro e econômico está em suspense aguardando as decisões que serão tomadas na 4ª feira pelo Federal Open Market Committee – FOMC. A decisão do órgão que deve iniciar o ciclo de baixa de juros nos Estados Unidos, com um corte de 0,25% ou 0,50% será anunciada às 15 horas. Isso dá ao Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) três horas, até às 18 hs, para decidir se a Selic será alterada ou ficará estável em 10,50% ao ano. O mercado prevê alta, dia 18, de 0,25% e já elevou em mais 0,25% a previsão da Selic para dezembro de 2025, agora estimada em 10,50%.
As projeções do mercado na Pesquisa Focus, encerrada 6ª feira e divulgada hoje pelo Banco Central, cravam um aumento de 0,25%, para 10,75%, com base nas novas projeções de aumento da inflação de 2024 (de 4,30% para 4,35% e 4,27% nas respostas dos últimos cinco dias úteis) e de 2025 (3,92% para 3,95% e 3,975 nos últimos cinco dias úteis). Outro fator foi o ajuste, para cima, da taxa do dólar (de R$ 5,35 para R$ 5,40 este ano e de R$ 5,30% para R$ 5,35 em 3035, sendo de R$ 5,40 as apostas dos últimos cinco dias úteis.
O dólar está em queda
Mas as últimas projeções no mercado financeiro americano, com aumento das apostas de um corte inicial de 0,50%, enfraqueceram mais uma vez o dólar nos mercados globais, com alta de ´0,41% do euro frente ao dólar, e de valorização de 0,60% da libra esterlina. Diante do iene, o dólar perdia 0,15% e tinha queda de 0,40% frente ao franco suíço por volta das 12 horas (de Brasília). Já em relação ao real, após abrir o dia a R$ 5,6667, as cotações despencaram mais de 1%, fixadas em R$ 5,5051 às 12:15. O cenário sugere cautela ao Copom.
Para o professor de finanças da FIPECAFI, (Instituição que vem da FEA-USP), Rogério Paulucci Mauad, mesmo que a inflação de agosto tenha vindo negativa (-0,02%), há uma pressão para os próximos meses em decorrência (...) do futuro aumento na conta de energia elétrica e do câmbio, que podem repercutir na elevação dos preços de commodities. “Com a deflação de agosto, há uma pressão dos setores produtivos para que o Copom mantenha a Selic estável. Contudo, mesmo com esta pequena deflação de agosto, o mercado espera que o BC inicie um ciclo de alta na Selic e eleve entre 0,25% e 0,50%”, argumenta.
Já o especialista em finanças da Fipecapi, Felipe Nasciben, lembra que os dados norte-americanos persistem em vir abaixo das expectativas já que a economia vem crescendo, mas em ritmo mais lento do que o imaginado e previsto. Para ele, o FOMC já deveria ter iniciado o ciclo de diminuição de juros na reunião anterior, mas optou por aguardar e manteve a faixa entre 5,25% e 5,50% - o que os coloca “atrás” da curva, atrasados frente às necessidades de incentivos. Assim nesta reunião deveria ser um relaxamento um tanto maior de 0,50% e, ainda, acredito que possa ser esse o movimento de fato. Parte do mercado já passa a acreditar mais nessa ação mais intensa”, explica.
“Se no Brasil, tivéssemos continuado o ciclo de baixa, essa combinação daria mais espaço para aumento de investimentos produtivos e valorização do índice Ibovespa. (...) “localmente teremos o contrapeso ao movimento americano pelos desafios internos que deverão fazer com que os juros se mantenham”, finaliza Nasciben.
Genial vê 'dilema do Banco Central'
Para o economista-chefe da Genial Investimentos, José Marcio Camargo, o Banco Central está sob um dilema para decidir, três horas depois do Federal Reserve dar início ao ciclo de baixa de juros nos Estados Unidos, se aumenta ou não os juros no Brasil, diante de uma conjuntura de expectativas desancoradas para a inflação futura, mas, com desaceleração na inflação corrente mesmo com dados que mostram uma economia aquecida.
“Os dados de atividade da economia brasileira continuam mostrando um desempenho acima do esperado pelos analistas. Após o forte crescimento do setor de serviços, 1,2% em julho em relação a junho, quando as expectativas apontavam para estabilidade, os dados de expansão se repetiram no setor de comércio: as vendas no varejo no conceito restrito mostraram aumento de 0,6% em julho (expectativas de 0,5%) enquanto no conceito ampliado cresceram 0,1%, contra expectativas que apontavam queda de -0,4% no mês”.
“O crescimento de 1,4 do PIB no 2º trimestre frente ao 1º de 2024 e o bom desempenho do mercado de trabalho refletem este bom comportamento da atividade, com taxa de desemprego em níveis baixos historicamente (6,8% da força de trabalho) e crescimento real da massa salarial próximo 8,0% ao ano”.
“Estes dados mostram uma economia bastante aquecida. Apesar do aquecimento da atividade econômica, a variação dos preços no mês de agosto, o IPCA, não apenas mostrou deflação de -0,02%, como apresentou uma boa composição, com desaceleração dos núcleos de inflação, dos preços dos produtos industriais, dos serviços e dos serviços subjacentes”.
Mas, “as expectativas para a inflação nos próximos quatro anos continuam acima das respectivas metas e a política fiscal continua excessivamente expansionista e incapaz de estabilizar a dívida pública, gerando forte pressão sobre as taxas de juros dos títulos longos e sobre a taxa de câmbio. A questão é como irá reagir o Banco Central diante do cenário de economia aquecida, expectativas para a inflação acima da meta, taxa de juros e de câmbio pressionadas e inflação presente bem-comportada. Este o dilema do Banco Central na reunião de quarta-feira”, conclui José Márcio Camargo.
Abit: alta de juros compromete recuperação econômica
Já a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), em nota do presidente do seu Conselho de Administração, Ricardo Steinbruch, manifesta sua “posição contrária a qualquer aumento da Selic neste momento. O Brasil tem hoje um dos juros reais mais altos do mundo. Esse fator é extremamente nocivo para a indústria, todos os setores produtivos e a economia como um todo, pois dificulta o aumento dos investimentos, impede o crescimento sustentado e sustentável do país e reduz a competitividade das empresas nacionais no cenário global”, diz a nota.
A Abit reconhece fatores que pressionam os índices de preços no médio prazo. Mas, destaca, a inflação de agosto de 2024 foi negativa, indicando tendência de arrefecimento dos preços” e que, “apesar das dificuldades orçamentárias, o Brasil não se encontra em uma situação de dominância fiscal”.
Diante do cenário de queda de juros nos Estados Unidos, a Abit considera infundada a pressão por aumento da taxa de juros na reunião Copom. “Nossa posição baseia-se no fato de que uma elevação causará mais danos à economia do que benefícios no controle inflacionário. Os investimentos industriais, fundamentais para a recuperação e crescimento mais robusto do PIB, serão severamente prejudicados”. Para a entidade, o Brasil necessita encontrar um caminho para ter, de maneira estrutural e permanente, juros reais em patamares razoáveis e alinhados à realidade internacional.”
“A (...) conjuntura presente exige cautela e responsabilidade na condução da política monetária. Um aumento na taxa de juros neste momento seria contraproducente e poderia comprometer a recuperação econômica em curso. Instamos, portanto, o Banco Central a manter a Selic em seu patamar atual, focando em medidas que estimulem o investimento produtivo e o crescimento”.