O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Como economizar mais nas estatais?

Publicado em 17/10/2024 às 19:40

Para obter o equilíbrio do Orçamento Geral da União sem cortar linearmente programas sociais, mas apenas fazer clivagem dos desvios e fraudes, o governo enviou ao Congresso dois projetos de lei para ajustar as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs) de 2024 e 2025, para incluir o contrato de gestão das estatais, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O contrato estabelece objetivos e metas de desempenho para as empresas controladas pela União e dá-lhes autonomia gerencial, orçamentária e financeira.

O governo precisa cortar entre R$ 30 bilhões e R$ 50 bilhões no OGU de 2025 e, além de cortes no seguro-desemprego da Previdência e no cadastro de programas sociais, mira nas estatais. Das 44 estatais, que empregam cerca de 490 mil brasileiros, 27 são rentáveis e 17 dependentes do Tesouro Nacional. Segundo balanço do Ministério de Orçamento e Gestão, as 17 estatais que não conseguem se sustentar e precisam de cobertura do Tesouro exigiram, em 2023, R$ 23,939 bilhões de subvenções, num aumento de 8,9% sobre 2022.

Num balanço entre as estatais, as que são rentáveis acumularam lucro de R$ 197,9 bilhões em 2023, liderados pelos recordes R$ 125,2 bilhões da Petrobras. Já as 17 da coluna do deve, geraram despesa de R$ 23,939 bilhões, largamente coberto pelos dividendos transferidos à União pelas rentáveis. Não cabe demonizar as estatais que nem sempre podem ter fins lucrativos e precisarão de cobertura. De janeiro a agosto, as estatais (federais e de estados e municípios) dividiram em quase 50% prejuízo de R$ 7 bilhões.

Quando se examina o rombo, pelo lado federal, verifica-se que, mais da metade dos gastos no ano passado vem da rede de hospitais e serviços hospitalares do governo, alocados entre os ministérios da Educação e da Saúde. Os recursos do Tesouro Nacional possibilitaram, em 2023, a realização de mais de 8 milhões de consultas e 283 mil cirurgias pelas empresas consideradas dependentes que atuam na área de serviços hospitalares (Ebserh, HCPA e Grupo Hospitalar Conceição) e que, juntas, receberam 56% de todas as subvenções do Tesouro para empresas estatais

Entre outras empresas em que os débitos superam os créditos (são bancados pelo OGU e ficam sujeitas ao limite de gastos), estão a Conab, Codevasf, Embrapa e Telebrás. Com criatividade, “marketing” e gestão, algumas destas empresas, em especial a Embrapa, podem trocar a coluna dos débitos pela de crédito. Entretanto, mais da metade das estatais são em atividades nas quais a iniciativa privada não quer substituir o Estado. Embora haja espaço para cortar despesas com melhoria da gestão. Uma das vantagens da autonomia é não ficar sujeita ao teto salarial do funcionalismo de R$ 44 mil.

Vejam abaixo, que entre as 10 maiores despesas das estatais as três entidades que respondem por serviços hospitalares (a começar pela Ebserh – Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares do MS, HCPA e Grupo Hospitalar Conceição) realizaram 8 milhões de consultas e 283 mil cirurgias, recebendo 56% de todas as subvenções do Tesouro para empresas estatais. O escândalo dos transplantes no Rio de Janeiro, que infectaram seis pacientes com o vírus do HIV, por terceirização dos serviços de controle ambulatorial, indica que é uma área em que o Estado precisa estar atento.


Fonte: Siest OLM

O joio e a joia

Há exemplos de estatais que podem ser eficientes e gerar receitas para a União. A Embrapa recebeu 16% das verbas do OGU das estatais no ano passado, mas pode fazer pesquisas dirigidas com retorno lucrativo. As empresas mundiais de sementes e herbicidas fazem isso. O preço da cesta básica, no Brasil, caiu em mais de 50% desde a criação da Embrapa, em 1973, que transformou o país em um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do mundo.

As tecnologias e cultivares desenvolvidos pela Embrapa e transferidos à sociedade geraram, ao longo de 2023, segundo estimativas da empresa, impactos econômicos da ordem de R$ 84 bilhões. Desse total, cerca de R$ 80,5 bilhões se referem aos benefícios econômicos decorrentes da adoção de uma amostra de 182 tecnologias que, entre outros pontos, aumentam a produtividade e reduzem os custos para os produtores agropecuários. Outros R$ 3,5 bilhões referem-se aos impactos gerados por cultivares desenvolvidos pela empresa e seus parceiros.

As empresas ligadas ao Ministério da Defesa, além de garantir o suprimento de munições para as Forças Armadas, possibilitam o domínio de tecnologias-chave, como é o caso da capacidade de construção e entrega de submarinos – em especial, o submarino convencional de propulsão nuclear – e de fragatas da Marinha do Brasil, com a incorporação e integração de avançados sistemas de armamento e controle. São os casos da Amazul, da Emgepron, da Imbel e da NAV Brasil, responsável pela prestação de serviços de navegação aérea. Todas estão se tornando mais rentáveis e podem andar sozinhas.

A CBTU opera a rede de trens urbanos das regiões metropolitanas de Recife/PE, Natal/RN, João Pessoa/PB e Maceió/AL, somando 17 municípios, com população acima de 6,3 milhões de pessoas. Até março de 2023, a empresa também era responsável pela operação dos trens urbanos da região metropolitana de Belo Horizonte, privatizados em leilão em dezembro de 2022.

A visão do mercado

Esse comentário do economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, sintetiza a visão do mercado sobre a questão fiscal e as estatais:

“A questão fiscal continua a gerar ruídos. Ontem foi a notícia de que o governo enviou ao Congresso projetos de lei que retiram as empresas estatais dependentes financeiramente do governo dos limites do arcabouço fiscal. Segundo a consultoria do Senado, os projetos, se aprovados, iriam dificultar o controle de gastos destas estatais e permitir que estes gastos fiquem fora do orçamento e acima dos limites definidos pelo arcabouço fiscal”.

“O ministro Fernando Haddad afirmou ao longo do dia que, ao contrário, os projetos têm por objetivo criar condições para que estas empresas consigam “se emancipar” e se tornar orçamentariamente independentes do governo federal. Entretanto, criou mais ruído ao afirmar que, caso a redação deixe alguma dúvida quanto ao objetivo do projeto, o Ministério está disposto a ajustar a redação para “deixar mais clara” a intenção do governo”.

“O ministro também afirmou que o programa de revisão de gastos está em estudos e que somente fará anúncio de seu conteúdo quando tudo estiver “alinhado”, para evitar ruídos desnecessários. Por esta razão, não deu qualquer indicação de que reformas estão em discussão e quanto será economizado caso o projeto seja aprovado. O que gera mais dúvidas entre os investidores sobre o que será efetivamente enviado ao Congresso”.

“Diante do elevado nível de incerteza fiscal, o governo somente consegue captar recursos para financiar a dívida em prazos cada vez menores a custos mais elevados e pressão permanente sobre o real”.

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