O OUTRO LADO DA MOEDA
Selic em 12% este ano e 13,35% em 2025?
Publicado em 02/12/2024 às 16:28
Alterado em 02/12/2024 às 16:28
O dólar retomou os negócios com pleno vigor após o feriado nacional de Ação de Graças nos Estados Unidos e registra nesta segunda feira forte alta contra o euro (+0,85%), contra a libra esterlina (+0,69), o iene (+0,19%), o franco suíço (+0,77%), o dólar canadense (+0,47%) e o peso mexicano (+0,95%) – depois da China os dois países da Alca serão os mais taxados pelo governo Trump. Diante da pressão internacional, a escalada continuou contra o real. O dólar abriu o dia cotado a R$ 6,0673, chegou à máxima de R$ 6,1150, mas, por volta do meio-dia, cedia ligeiramente a R$ 6,0692, com alta de 1,611%.
A escalada do dólar sepulta as esperanças do Banco Central de cumprimento da meta de inflação: 3,00%+1,50% de tolerância=4,50%, que poderia ser possível com o alívio do dólar e a adoção da bandeira verde para a energia elétrica em dezembro. As projeções do mercado, na Pesquisa Focus, encerrada sexta-feira pelo Banco Central elevaram a previsão do IPCA de dezembro de 0,51% pra 0,52% e as respostas dos últimos cinco dias úteis (considerando o novo patamar do câmbio) situaram a taxa em 0,56%, coerente com a previsão de 0,55% da LCA Consultores.
Com essa variação, e a expectativa de 0,27% a 0,34% para o índice de novembro, que o IBGE divulga dia 10, o IPCA, que acumula 3,88% até outubro, saltaria de 4,63% (previsão da semana anterior, para 4, 71% e 4,84% nas projeções dos últimos cinco dias úteis. Com o novo estouro do teto das metas de inflação, o mercado prevê alta de 0,75% na Selic em 11 de dezembro, com a taxa fechando o ano em 12%.
E, com a piora das previsões do IPCA para 2025 (de 4,34% para 4,40% e 4,39% nas projeções dos últimos cinco dias úteis – quase no teto da meta, de 4,50% - o mercado elevou a mediana da meta da Selic de 12,25% para 12,63% em dezembro de 2025, com as respostas dos últimos cinco dias situando a Selic em 13,25% no final do ano que vem. O mercado elevou a Selic de 2026, de 10,00% para 10,50%.
Em palestra nesta manhã, em São Paulo, o atual diretor de Política Monetária e presidente já confirmado do Banco Central em 1º de janeiro de 2025, Gabriel Galípolo, reagiu com realismo às pressões inflacionárias e às desconfianças do mercado, afirmando que uma economia aquecida e com uma moeda mais desvalorizada, “parece lógico” que “demande uma política monetária mais contracionista”, com taxas de juros mais altas.
IBGE divulga PIB no pico
Amanhã, por sinal, o IBGE divulga o resultado do PIB no 3º trimestre (julho a setembro), com previsões de que a economia ainda esteja acelerada (o impacto da alta dos juros começa em setembro). As previsões variam de 0,60% do Itaú, a 1,00% do Bradesco. A LCA Consultores prevê 0,90% a o Santander, 0,70%. Com isso, o mercado elevou a previsão do PIB de 2025 de 3,12% para 3,17%, com as projeções dos últimos cinco dias úteis situadas em 3,28%. Para 2025, apesar de prever juros mais altos (que deprimem o PIB), houve revisão de 1,95% para 2,00% no desempenho da economia no ano que vem, nível mantido para 2026.
Reprovado, Campos Neto passeia em Miami
Com a 3ª reprovação no cumprimento das metas de inflação ( 2021, 2022 e 2014) em seis anos de mandato à frente do Banco Central (2018 a dezembro de 2024), o presidente Roberto Campos Neto parecia alheio ao incêndio na taxa de câmbio no Brasil ao passear semana passada em Miami, quando ainda jogou gasolina no fogo, dizendo que “um investidor [sem dizer a qualificação] previu dificuldades para o Brasil em 2025”.
Campos Neto estourou as metas de inflação em 2021 (o teto era de 5,50% e o IPCA subiu 10,06%, com forte pressão dos preços dos alimentos). Em 2022, a meta era de 5,00% e os cortes eleitoreiros de impostos federais e estaduais, feitos por Paulo Guedes, na gasolina e demais combustíveis, energia elétrica e comunicações ainda que tenham reduzido a inflação à metade que estava em junho, não impediram o estouro na meta, com o IPCA de 5,79%, nem a derrota de Bolsonaro para Lula.
Agora, no 3º estouro da taxa de inflação (o teto da meta é de 3,00%+1,50%=4,50%) e o IPCA deve chegar a 4,71% na mediana do mercado (e a 4,81% nas respostas dos últimos cinco dias úteis, como preveem o Santander e o Itaú), Campos Neto e equipe até que vinham segurando a inflação no 1º semestre. Depois de começar janeiro em 4,51%, as taxas em 12 meses desceram a 3,69% em abril, voltaram a subir a 3,93% em maio e fecharam junho a 4,23%, já empurrada pelos efeitos climáticos das chuvas no Rio Grande do Sul entre abril e maio.
Mas, numa prova de que a política monetária é impotente para neutralizar efeitos climáticos, as secas e incêndios que pipocaram no Sudeste, Centro-Oeste e Amazônia, tiveram forte impacto nos preços dos alimentos, em especial na carne, e nas tarifas de energia elétrica, com a adoção da bandeira vermelha 2 em outubro (agora voltou a verde, do amarelo de novembro), mas sem tempo de neutralizar a escalada dos alimentos alimentada pela alta do dólar.
Só que, pelo ritual das cartas de explicação para eventuais estouros das metas que os presidentes do Banco Central devem fazer ao presidente do Conselho Monetário Nacional (seja sob o comando do ministro da Economia, no caso Paulo Guedes, no governo passado, ou da Fazenda, Fernando Haddad), a missiva deve ser entregue na 2ª semana do 1º mês do ano seguinte. Lá pelo dia 10 ou 13 de janeiro, Roberto Campos Neto, o responsável direto por três das oito cartas de explicação para o estouro da meta de inflação estará sob quarentena e a explicação será formalmente de Galípolo a Haddad.
O histórico dos estouros
A primeira carta foi escrita, em 2001, por Armínio Fraga ao ministro da Fazenda, Pedro Malan (o teto da inflação de 2000 era de 6% e deu 7,67%). Em 2002 houve um novo grande estouro. Com dupla pressão da estiagem, que levou ao racionamento de energia de 2001, e da escalada do dólar, com o crescimento de Lula nas pesquisas até a vitória, em 2002, o teto era 5,50% e o IPCA subiu 12,53% e Henrique Meirelles escreveu a carta a Antônio Palocci. Em 2003, mesmo alterando-se o teto da meta de 5,25% para 6,5%, o IPCA chegou a 9,30%. De novo Meirelles se explica a Palocci. Para evitar novo estouro em 2003, o telo foi elevado a 8,00% e o IPCA ficou em 7,60%.
O teto da meta voltou a estourar em 2015 (era de 6,50%), mas o choque de tarifas, com aumentos de preços públicos congelados para a reeleição de Dilma, em 2014, juntamente com a liberação do câmbio, levou o IPCA para 10,67%. Desta vez foi Alexandre Tombini quem assinou a carta do BC ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
O único estouro – do piso
Em 2017 houve o único estouro, não no teto, mas no piso da meta de inflação: a meta era de 4,50%, com tolerância de 1,50% para cima ou para baixo. Ou seja, o teto era de 6,00% e o piso de 3,00%, mas o IPCA subiu apenas 2,95%. Em parte, porque houve uma boa recuperação das safras (os alimentos, que subiram 12,03% em 2025 e 8,62% em 2016, tiveram deflação de 1,87% em 2017). Assim, Ilan Goldfajn teve que se explicar a Henrique Meirelles (agora ministro da Fazenda e presidente do CMN) pelo excesso do rigor monetário do Banco Central.
Como se percebe, as cartas são lições de economia. Fatos exógenos à política monetária (que não é infalível) costumam levar ao cumprimento ou estouro das metas.