O OUTRO LADO DA MOEDA
Dez itens geraram 40% da inflação
Publicado em 10/01/2025 às 14:09
Alterado em 10/01/2025 às 14:09
A inflação de 0,52% em dezembro, abaixo da estimativa de 0,54% do mercado, elevou a taxa anual para 4,83% e estourou o teto da meta de inflação do Banco Central (3,00%+1,50% de tolerância+4,50%).
Mas o exame dos fatores de pressão – 10 itens responderam por 40,16% da variação do IPCA no ano – mostra que a alta do custo de vida para as famílias com renda até 40 salários-mínimos (R$ 56.480) foi concentrada em produtos alimentícios (o item Alimentação e Bebidas subiu 7,69% e respondeu por 1,63 ponto percentual da taxa de inflação no ano passado), em Saúde e Cuidados Pessoais (alta de 6,09%, que pesou 0,81 p.p., liderada pelo reajuste de 7,87% nos Planos de Saúde) e pelo aumento de 3,30% em Transportes (que pesou 0,69 p.p. no IPCA). Os três itens somaram 3,13 p.p., correspondendo a 65% da inflação.
Mas, quando se decompõe o IPCA verifica-se que 10 dos 377 itens pesquisados pelo IBGE representaram 1,94 p.p., ou 40,16% do IPCA. O tem de maior peso nas despesas da classe média alta é a gasolina (4,96 p.p.), que subiu 9,71% no ano passado e contribuiu com 0,48 p.p. para a inflação. A gasolina subiu menos que os 12,09% de 2023 (quando houve recomposição dos impostos federais e do ICMS cortados eleitoralmente por Bolsonaro no 2º semestre de 2022), mas sua alta no ano passado foi mais influenciada pelo aumento de 17,58% do etanol. Como a gasolina comum recebe uma mistura de 27% de álcool anidro, os reajustes do etano impactam os preços na bomba de combustível. O 2º item de maior peso (0,31 p.p. no IPCA foi o reajuste de 7,87% nos Planos de Saúde.
Clima e dólar disparam preços de alimentos
Depois de ter aumentado apenas 1,03% em 2023, pelo impacto da supersafra de grãos que derrubou os preços (os alimentos tinham subido 11,64% em 2022, o que explica, em parte a derrota de Jair Bolsonaro para Lula), uma combinação de fatores climáticos extremos (no Brasil e no exterior) derrubou a safra de grãos no Brasil e a produção em outros países – caso do café que tem o Vietnã como o 2º produtor mundial, após o Brasil e o produto foi o que mais subiu na cesta de alimentos – alta de 39,60% no preço do café moído em 2024. Excesso de chuvas afetou a produção agrícola do Rio Grande do Sul (o 5º produtor do país) em maio, seguindo-se secas e incêndios no Sudeste, Centro-Oeste e Amazônia até julho. Isto impactou os custos de lavouras como cana-de-açúcar, cítricos e o confinamento de gado de corte.
Para piorar, a escalada do dólar no 2º semestre (27% no ano), com os temores sobre as promessas de aumentos tarifários por Donald Trump, afetou os preços dos produtos agrícolas, minerais e industriais transacionáveis com o exterior. Vale destacar que se o governo Lula não tivesse aposentado, em maio do ano passado, quando passou a “abrasileirar” os preços dos combustíveis, o sistema de paridades de preços internacionais (com reajuste quase automático dos preços domésticos pela variação dos preços nos mercados internacionais atualizados pela taxa de câmbio), a inflação teria explodido ainda mais. São os ganhos da alta produção da Petrobras no pré-sal, cujo óleo mais leve tem sido refinado com uso de 96% de capacidade instalada de suas refinarias (que seriam 50% vendidas com Bolsonaro reeleito).
Ou seja, os impactos na inflação deixariam o Banco Central completamente impotente para coibir a escalada dos preços com o uso das taxas de juros. Derrubariam a economia sem conseguir neutralizar os impactos de fora (como já percebera Paulo Guedes, ministro da Economia, ao cortar os impostos de combustíveis, energia elétrica residencial e comunicações em fins de junho de 2022). Juros moderam a alta de preços na economia, mas podem pouco contra altas exógenas (choques de câmbio, climáticos). O máximo que atuam é sobre os efeitos de repasses de preços. Tarefa mais difícil no Brasil dado o forte grau de indexação na economia. Itens com reajustes anualizados (como planos de saúde, condomínios, educação, serviços bancários e aluguéis) foram os que mais subiram, depois da escalada de preços de produtos por clima e dólar. O índice de difusão de preços em aumentou subiu de 65% dos alimentos em novembro para 69% em dezembro e saltou de 52% para 69% nos bens e serviços não alimentícios, mostrando que o Banco Central tem de ser firme nos juros e torcer para o dólar não disparar (hoje sobe mais de 1,24% a R$ 6,11).
Na Alimentação e Bebidas houve um salto nos preços das carnes, com alta de mais de 20%, lideradas pelo aumento de 25,24% no quilo do Acém (corte usado pelas camadas de menor renda). A quebra de quase 10% na safra da soja influiu, junto com a escalada do dólar, no aumento de 29,21% no preço do litro do óleo de soja. O preço do limão, cuja safra, como a da laranja, sofreu, com a estiagem, teve forte baixa em dezembro, mas ainda acumulou alta de 28,29% no ano. O leite longa vida, outro afetado pela estiagem prolongada nos pastos e nos impactos nas lavouras de grãos, fechou o ano com alta de 18,83%. O arroz, cujos preços caíram em dezembro, com o impacto da safra esperada para janeiro no RS, ainda acumulou alta de 8,24% no ano.
A refeição fora de casa subiu 5,70% e pesou 0,20 p.p. no IPCA, onde a Alimentação e Bebidas respondeu por 33,7% das despesas. Mas é nas classes de renda mais baixa, cuja cesta de consumo é pesquisada pelo IBGE no INPC (que acompanha a renda das famílias que ganham até cinco salários-mínimos - R$ 7.060 em 2024) que a alimentação pesa mais. Enquanto o INPC variou 4,77%, o item Alimentação e Bebidas subiu 7,60%. No ano de 2023, com a supersafra, Alimentação e Bebidas tinha subido apenas 1,03% no INPC, sendo de apenas 0,30% a alta dos alimentos.