
O OUTRO LADO DA MOEDA
O leão do déficit virou um rato
Publicado em 31/01/2025 às 15:21
Alterado em 31/01/2025 às 15:21
E o déficit fiscal primário do setor público consolidado, que chegou a ser estimado pelo mercado financeiro – que nunca levou fé na gestão do Ministério da Fazenda para acomodar receitas e despesas – que estimava o rombo como um leão de R$ 100 bilhões e até R$ 150 bilhões nas análises mais pessimistas, terminou o ano de 2024 como um rato de apenas R$ 47,6 bilhões (0,40% do PIB), ante déficit de R$ 249,1 bilhões (2,28% do PIB) em 2023. Em dezembro, houve superávit primário de R$ 15,7 bilhões no setor público consolidado, contra déficit de R$129,6 bilhões no mesmo mês de 2023, quando os pagamentos dos precatórios, caloteados pelo governo Bolsonaro desde 2021, somaram R$ 92,4 bilhões. Teve razão o presidente Lula de ironizar o pessimismo do mercado financeiro. Por sinal, o dólar está sendo negociado, no dia de formação da Ptax de janeiro, a R$ 5,82490, depois do meio-dia, uma queda de 0,84%.
Contrariando as apostas do mercado, o ano de 2024 registrou aumento na receita total (+9,1%) e na receita líquida (+8,9%), com sucesso em diversas medidas fiscais aprovadas na Receita Administrada pela RFB (+12,5%), como a tributação sobre combustíveis (desonerados eleitoralmente por Bolsonaro no 2º semestre de 2022), recolhimentos extraordinários sobre fundos exclusivos e “offshore” e medidas adotadas para a redução de subvenções e limitação de compensações tributárias. A receita também cresceu pela atividade econômica e a alta da inflação. Mas, uma grande medida fiscal que fracassou no ano passado estava relacionada aos recolhimentos adicionais com o voto de qualidade no CARF, com impacto estimado inicialmente pelo governo em R$ 55,0 bilhões; a arrecadação observada foi de apenas R$ 0,3 bilhão. Na Receita Não Administrada pela RFB (+3,6%), o destaque são os dividendos extraordinários.
Já a despesa, leve retração no período (-0,7%). Houve forte efeito de uma base elevada na comparação, como 1) precatórios extraordinários no valor de R$ 92,4 bilhões, que se distribuíram em várias linhas e 2) apoio financeiro a estados e municípios pela reclassificação de bens essenciais no ICMS em R$ 21,1 bilhões. Abono e seguro-desemprego (+6,2%) e BPC (+14,9%) consolidaram altas semelhantes ao que foi observado nos últimos meses. As Obrigatórias com Controle de Fluxo (+4,7%) sofreram pressões por conta de maiores gastos em saúde e educação para cumprimento dos mínimos constitucionais vinculados à receita.
Como participação do PIB, a receita líquida avançou de 17,4% em 2023 para 18,3% em 2024. A LCA Consultores espera para 2025 que a receita líquida permaneça neste patamar. No sentido contrário, as despesas recuaram de 19,5% em 2023 para 18,7% em 2024. Esse nível de despesa deve voltar a subir em 2025 para 18,9%, uma vez que, entre outros motivos, voltarão a ocorrer pagamentos de precatórios extras, da ordem de R$ 44 bilhões.
Na análise dos últimos anos pode-se decompor os resultados de 2022 com superávit irreal de R$ 125,9 bilhões (1,25% do PIB), porque houve calote dos precatórios, de restos a pagar e antecipação de pagamento de dividendos de empresas e bancos estatais, e consequentemente, os números de 2023, no 1º ano do governo Lula, foram também irreais e o Congresso sabia disso. Tanto que autorizou amplo aumento dos gastos de 2023, em dezembro de 2022. Assim, o rombo de R$ 249,1 bilhões (2,29% do PIB) compreendendo R$ 92,4 bilhões de acerto de precatórios atrasados, recomposição de receitas de ICMS dos Estados (e municípios, via cota-parte) e restos a pagar.
A LCA observa que para este ano, quando o governo projetou déficit de 0% do PIB, o Tesouro Nacional ainda vai colocar em dia o pagamento de mais R$ 44 bilhões de precatórios atrasados.
Veja como foram os resultados do governo central:
2019: superavit de 0,84% do PIB (61,8 bilhões)
2020: déficit de 9,24% do PIB (702,9 bilhões)
2021: superavit de 0,72% do PIB (64,7 bilhões)
2022: superávit de 1,25% do PIB (R$ 125,9 bilhões)* Calote de R$ 130 bilhões em precatórios
2023: déficit de 2,29% do PIB (249,1 bilhões)** Tesouro pagou R$ 92,4 bilhões em precatórios
2024: déficit de 0,09% do PIB (11,0 bilhões)
...E quais são as previsões:
2025: déficit 0% do PIB
2026: superávit de 0,25% do PIB (R$ 33,1 bilhões)
2027: superávit de 0,50% do PIB (R$ 70,7 bilhões)
2028: superávit de 1% do PIB (R$ 150,7 bilhões)
Juros e INSS são o pesadelo do governo
Quando propôs a reforma da Previdência Social, em 2019, o então Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes, estimou que a reforma teria um impacto potencial de reduzir o rombo previdenciário de R$ 800 bilhões a R$ 1,07 trilhão em dez anos. Mas o andamento da reforma não correu como o planejado. O ex-presidente Bolsonaro evitou atacar as aposentadorias das forças armadas e das forças policiais estaduais. Do mesmo modo, não quis se indispor com os que recebem altos salários na administração pública, no Judiciário e no Ministério Público. São questões que continuam em aberto e pedem urgência de ajustes na Previdência.
O resultado é que o rombo do INSS (Regime Geral da Previdência Social) continua pressionando as despesas do Orçamento Geral da União (OGU), tolhendo investimentos e programas sociais e forçando o governo a aumentar o endividamento pública para financiar o rombo do INSS. O Ministério do Planejamento previa em outubro, o rombo da Previdência Social (despesas acima das receitas) deverá avançar de R$ 272,6 bilhões, em 2024 (na verdade, foi de R$ 297,2 bilhões, quase R$ 25 bilhões a mais); para 2025 a previsão é de R$ 293,5 bilhões em 2025. Na proporção com o PIB, o governo prevê que o déficit do INSS ficará estável em 2,37%.
O rombo do INSS é o principal determinante do déficit público primário (receitas – despesas, sem considerar os juros da dívida pública) do Governo Central (Governo Federal + INSS + Banco Central). O rombo é financiado pelo aumento da dívida pública, cujo nível de juros da taxa Selic impacta o crescimento da economia, do consumo e dos investimentos e deteriora a relação dívida/PIB.
Com a recente escalada dos juros (que não cairão tão cedo), o quadro só tende a piorar. Em 2019, ano da reforma, o rombo do INSS (R$ 213,1 bilhões, representava 68% dos juros do ano. Os juros caíram aos níveis mais baixos eme 2020, quando em plena pandemia da Covid, o Banco Central liberou compulsórios e reduziu a Selic a 2% ao ano. Neste ano, o rombo do INSS chegou a Desde 2021, o rombo do INSS chegou a 83% dos juros do ano. De lá para cá, a conta de juros não parou de crescer (triplicou frente a 2020) e a responsabilidade anual do rombo do INSS alcança 31,3% dos encargos de juros. Uma bola de neve que não parar de crescer há quatro anos.
OLM