O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

gilberto.cortes@jb.com.br

O OUTRO LADO DA MOEDA

Até quanto e quando irá a Selic

Publicado em 20/03/2025 às 15:16

Alterado em 20/03/2025 às 15:16

O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) entregou a 2ª alta de 100 p.b. na taxa Selic que havia sido sinalizada em dezembro, em uma decisão amplamente esperada. O que se especula no mercado financeiro, depois que o Copom anunciou nova alta em 7 de maio, de “menor magnitude” é até onde e em quanto ficará a continuidade da alta do piso de juros no Brasil. Os setores produtivos, atingidos pela queda do consumo e o alto custo dos estoques, o que se traduz em redução dos investimentos, ânsia pela breve interrupção do ciclo de alta ainda no 1º semestre (há outra reunião em 18 de junho). Mas há apostas de baixa em novembro ou dezembro.

O Copom assinalou que a atividade econômica está desacelerando, mas que ainda enxerga riscos assimétricos (para cima) no cenário de inflação (a qualificação do balanço de riscos também foi um tema de discussão entre os participantes do mercado). A projeção de inflação do comitê para o horizonte relevante da política monetária – 3º trimestre de 2026 - está em 3,9%, nível que considera “elevado”. embora de forma incipiente. Um dado importante foi que os membros do Copom destacaram que os movimentos futuros levarão em conta os efeitos defasados das decisões passadas da política monetária (pois seus efeitos costumam demorar seis a nove meses). Ou seja, depois de chegar ao pico, o Copom ainda vai esperar um tempo para a economia dar sinais de queda da inflação e de que os juros podem cair, pois o cenário futuro está mais favorável.

É em cima desta observação que o mercado está dividido se o ciclo de alta pára em 28 de junho ou 30 de julho. Tudo depende do andamento da economia internacional e dos reflexos nas taxas de câmbio [hoje, com a advertência da presidente do Banco Central Europeu, Cristine Lagarde, de que a economia do bloco do euro poderá ter desaceleração, o euro sofreu forte queda frente ao dólar, já o iene, com a decisão do Banco do Japão de manter os juros de 0,50% ao ano, depois que o Fed manteve as taxas estáveis entre 4,25% e 4,50 e sinalizou duas baixas de 0,25% este ano, o iene abriu em alta mas desvalorizou; o real, por sua vez também caiu 0,39% até 11:10, quando o dólar era negociado a R$ 5,6730, acompanhando a alta de 0,23% do dólar contra o dólar canadense e de 0,78% contra o peso mexicano].

As previsões do pico

O Itaú, que inicialmente previa que a Selic fecharia o ano em 15,75% e reviu a projeção para 15,25%, no cenário de março divulgado esta semana, ainda aposta em mais dois aumentos em suas próximas reuniões, levando a Selic ao patamar final de 15,25% até meados do ano (30 de julho). E diz aguardar mais sinais na divulgação da ata, dia 25. Ou seja, pode vir a aplicar viés de baixa ao longo do 2º semestre.

A LCA Consultores observa que “a inflação continua acima da meta; as medidas de tendência inflacionária aceleraram novamente; e as expectativas inflacionárias seguiram desancoradas e em deterioração. O balanço de riscos para a inflação segue com assimetria altista, num contexto em que o hiato do produto se encontra em campo positivo. A projeção de inflação do Comitê foi ligeiramente revisada para baixo, passando de 4,1% para 3,9% até o 3º trimestre de 2026, devido à menor alta dos preços administrados, provavelmente em função da queda nos preços internacionais do petróleo e ao câmbio menos pressionado. Apesar dessa revisão, a inflação de preços livres permaneceu em 3,8%, com a elevação das expectativas contrabalançadas pelo câmbio mais favorável. As projeções de mercado foram ajustadas para 5,7% em 2025 e 4,5% em 2026”. A expectativa da LCA para a taxa Selic prevê elevação para 15% ao ano até a reunião de 18 de junho. E a taxa ficaria estável no 2º semestre?

O Bradesco, de onde saiu como diretor de Tesouraria, o sucessor de Gabriel Galípolo, atual presidente, na diretoria de Política Monetária, Nilton Davi, aposta que a Selic fechará o ano em 14,75%. Ou seja, depois do pico de 15,25% ou 15,00%, pode cair em 5 de novembro ou em 10 de dezembro, quando haverá reuniões do Copom.

Enquanto os juros altos desaceleram a economia e tende a esfriar a marcha da inflação, o governo implementa o crédito consignado aos trabalhadores com carteira assinada no setor privado, para reduzir a mais da metade os juros dos empréstimos que tinham passado a faixa dos 100% ao ano no crédito pessoal não consignado. A financeira Crefisa, patrocinadora do Palmeiras, é uma das campeãs de juros altos: 785,94% ao ano, segundo levantamento do Banco Central até 21 de fevereiro. A Zema, financeira do governador de Minas Gerais, cobrava 336,54% ao ano. O juro com consignado para aposentados do INSS estava em 24%.

Fatores favoráveis

Até lá, há muita água para passar debaixo da ponte. Em primeiro lugar, esperam-se os impactos favoráveis da supersafra de grãos nos preços dos alimentos, tende a baixar os preços do arroz, do feijão, da soja e do milho e influenciar na baixa dos preços das rações que alimentam aves, suínos gado leiteiro e bois em confinamento, portanto, com grande impacto na cadeia alimentícia. O último IGP-M da Fundação Getúlio Vargas mostrou quedas de preços agrícolas no atacado. Na quinta-feira, 27 de março, o IBGE divulga o IPCA-15, prévia do IPCA, que pode confirmar a tendência no varejo.

O problema continua sendo o café, com forte valorização internacional após as quebras de safra no Brasil e sobretudo no Vietnã (2º produtor mundial) e na Indonésia (5º produtor). As isenções de impostos de importação podem ajudar, sobretudo as grandes firmas de café, que fecharam contratos de exportação recebendo adiantado com o compromisso de entrega futura do produto e foram apanhadas pela alta. A busca de estoques, num mercado estreito, acelerou ainda mais as cotações e atingiu os consumidores, com altas de quase 70% em 12 meses. Além do orçamento dos consumidores, há muitas firmas ameaçadas de quebrar recorrendo à Recuperação Judicial.

Outro ponto favorável diz respeito à tendência dos preços do petróleo e dos combustíveis. O Brent está praticamente estável no mercado futuro (US$ 71) e projeção para fechar abaixo de US$ 69 em dezembro. Tudo depende das tratativas de cessar fogo entre Rússia e Ucrânia, estimuladas por Donald Trump.

O mercado de trabalho

Um dado importante, que não foi mencionado no Comunicado do Copom, diz respeito ao mercado de trabalho. Em publicação desta semana pelo departamento de Estudos e Pesquisas Econômicas do Bradesco, a economista Myriã Bast analisa, com base em dados do IBGE e de pesquisa junto à clientela do Bradesco, o peso das pressões altistas da inflação no mercado de trabalho e conclui que “não encontramos evidências inequívocas de que haja falta de mão de obra de maneira generalizada. Sem dúvida, o mercado de trabalho está aquecido e o aumento do rendimento confirma isso. Mas esse aquecimento nos parece razoavelmente compatível com o ritmo de crescimento da economia nos últimos anos”

Na pesquisa junto aos diversos segmentos, notou-se na construção civil, “uma dificuldade maior de contratação” de mão de obra, mas “isso não é evidente em outros segmentos”. Para a economista, “a desaceleração do PIB deste ano deve levar a um menor dinamismo da ocupação, mas os rendimentos ainda irão crescer” Ela estima que “a massa salarial ainda subirá 3,8% em termos reais, neste ano, após três anos consecutivos com expansão ligeiramente superior a 7,0%, em média”.

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