O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

gilberto.cortes@jb.com.br

O OUTRO LADO DA MOEDA

Mercado em compasso de espera

Publicado em 28/03/2025 às 15:17

Alterado em 28/03/2025 às 15:17

Um dia depois do presidente, Donald Trump, anunciar para a próxima quarta-feira, 2 de abril, tarifas de 25% às importações de automóveis pelos Estados Unidos – o alvo principal são os carros elétricos e híbridos – os mercados de câmbio reagiram em compasso de espera. Os operadores de câmbio estão reclamando do alto custo de administrar o impacto das surpresas de Trump no portfólio das moedas.

À parte o impacto direto para conter importações e reduzir o trilionário déficit da balança comercial americana, a tática errática de Trump, segundo analistas, visa criar incertezas em relação às moedas emergentes ou alternativas ao dólar, em especial a união de países com fortes laços comerciais com a China (principal alvo das tarifas dos EUA) em torno do uso de uma moeda comum (uma moeda dos BRICS, por exemplo), em substituição ao dólar.

O impacto inicial, no entanto, tem sido um fortalecimento das cotações do ouro, considerando pelos analistas do Swissquote, como ainda o hedge mais confiável contra as tarifas impostas por Trump. O contrato de ouro para abril encerrou ontem a sessão com alta de 1,27%, a US$ 3.061,0 por onça troy, novo recorde de fechamento, na Comex, divisão de metais da New York Mercantile Exchange (Nymex). E hoje o contrato já era negociado acima de US$ 3.074. O novo vencimento futuro, de junho era cotado a US$ 3.110, com alta de 0,62%.

Os bancos centrais estão desnorteados. Os países mais atingidos pelas restrições comerciais (Canadá, México, China e União Europeia) estão mais preocupados com os impactos recessivos domésticos causados pelas tarifas. O Banco do México (Banxico) reduziu ontem a taxa básica de juros em 0,50% para 9,00% ao ano e anunciou nova baixa de igual magnitude para maio. O peso mexicano caía em relação ao dólar, que subia 0,33% depois do meio-dia (horário de Brasília), acumulando alta de 0,72% do dólar nesta semana.

O euro avançava 0,29% no mesmo horário e o dólar caía 0,55% frente ao iene. A moeda americana caía 0,15% contra o dólar canadense e subia ligeiramente contra o dólar australiano. Já em relação ao real, depois de oscilar a manhã na faixa de R$ 5,7550, o dólar subiu depois do meio-dia e era cotado a R$ 5,7610, às 12:13, com alta de 0,28% no dia e valorização de 0,45% na semana.

Sinais contraditórios

Enquanto o dólar oscilava, o mercado digeria dados do mercado de trabalho. Ao analisar o resultado da PNAD Contínua Trimestral do IBGE, que apresentou aumento para 6,8% na taxa de desemprego no trimestre móvel até fevereiro, contra 6,5% no trimestre móvel até janeiro, o economista da XP, Rodolfo Margato, considerou que o resultado dessazonalizado apresentou recuo de 6,6% para 6,5%, ou seja, “a taxa de desemprego continua a rodar em torno de 6,5%, um nível relativamente baixo comparado à série histórica iniciada em 2012”.

Ele aponta outros dados que confirmam o aquecimento do mercado de trabalho, fator que contribui para um ritmo mais lento da desaceleração da inflação: a população ocupada, cresceu 0,3% nas estimativas ajustadas sazonalmente pela XP, liderada pelas categorias formais (alta de 0,5% nos trabalhadores no setor privado com carteira assinada). Ele acredita que os dados do Caged de fevereiro, a serem divulgados à tarde, devem confirmar a força do mercado de trabalho, com a expectativa de cerca de 400 mil postos criados no mês.

Já as categorias informais vêm perdendo força, com uma queda ligeira de 0,2% na margem em fevereiro. Outro ponto que fortalece o consumo foi o crescimento de 0,5% nos rendimentos reais do trabalho, em fevereiro contra janeiro, tanto nos rendimentos habituais quanto nos efetivos. A escassez de mão de obra, com restrições de oferta, surge em muitos setores da economia brasileira. Por fim, a massa de renda real efetiva teve expansão de 6% em termos interanuais, indicando um nível forte de crescimento.

Para o Itaú, o resultado mostrou o mercado de trabalho “resiliente” e aponta, nos seus cálculos, que “a massa salarial real efetiva cresceu 0,8%”

As surpresas da inflação

O Itaú, ao analisar o Relatório de Política Monetária (novo nome do Relatório Trimestral de Inflação) e o IPCA-15 de 0,64% em março, destacou que resultado veio abaixo da expectativa e com qualitativo melhor do que o esperado, com surpresa baixista concentrada em industriais, disseminada entre os itens do grupo, sugerindo que o repasse da depreciação cambial pode ser menos intenso do que o banco esperava. Mas pôs dúvidas quanto à projeção do IPCA em 3,9¨no 3º trimestre de 2026.

O Itaú chamou a atenção para a visão que confirmaria uma desaceleração do PIB não agrícola. O comitê parece indicar que, mesmo que o crescimento do PIB do 1º trimestre seja bastante forte usando o método tradicional de ajuste sazonal (o consenso do mercado está em torno de 1,0% na variação trimestral dessazonalizada), mas sublinha que “na realidade a economia está desacelerando praticamente em linha com o esperado”.

Em outras palavras, com um crescimento ainda forte da demanda, o que gera maior resistência à baixa de preços causada pela supersafra (o café e os ovos têm influência externa: queda de produção no Vietnã e nos EUA, respectivamente), leva o Banco Central brasileiro a ficar num dilema em não exagerar a dose do remédio para não agravar, com os juros altos, os impactos recessivos das tarifas de Trump que tendem a afetar muito o Brasil no 2º trimestre em diante.

O Itaú acredita que a situação deve limitar a probabilidade de um aumento maior (75 p.b.) na próxima reunião. O banco ainda espera que o Copom encerre o ciclo com mais dois aumentos de 50 p.b., levando a taxa Selic a 15,25%.

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