O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

gilberto.cortes@jb.com.br

O OUTRO LADO DA MOEDA

Ações e commodities tombam com tarifaço

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Publicado em 07/04/2025 às 15:11

Alterado em 07/04/2025 às 15:14

Bolsa de valores de Hong Kong Foto: reprodução

A semana acelerou a volatilidade dos mercados de moedas, ações e commodities na expectativa da entrada em vigor do novo tarifaço dos Estados Unidos, com revide de 34% da China aos produtos americanos. Nos mercados asiáticos, que operam mais cedo, o índice Hang Seng, da Bolsa de valores de Hong Kong, caiu 13,22%, nível semelhante à crise asiática de 1997 e ao da crise financeira mundial de 2008. O índice Nikkei, do Japão, caiu 7,83%.

Os mercados ocidentais chegaram a ter um suspiro de alta quando surgiu o boato de que Trump suspenderia o tarifaço hoje. Mas, o desmentido do governo americano, com ameaça de impor mais 50% de aumento à China levou a nova queda geral. Às 12:45 (horário do Brasil), o índice Dow Jones, da Bolsa de Nova Iorque, caía 1,37%, a Nasdag tinha queda de 0,50% e o S&P 500 operava em baixa de 0,80%. Já o Ibovespa tinha queda de 1,72%.

Dólar e commodities na gangorra

Mas a força do dólar ante as principais moedas dos blocos ou países alvos do tarifaço americano, além de provocar sobe e desce no câmbio, com o euro tendo queda de 0,35%, a libra esterlina perdendo 1,17% diante do dólar e o iene desvalorizando mais de 0,50%, provocou alta de 1,42% do dólar frente ao peso mexicano, de 0,94% frente ao dólar australiano e de 1,35% frente ao real, com o dólar cotado a R$ 5,9210 às 12:56.

Como as mercadorias costumam ser negociadas nas bolsas em dólares, o fortalecimento da moeda americana provocou queda do ouro (-1,10% às 13:00 – horário de Brasília), de 1,75% no barril petróleo tipo Brent, de 4,42% no Contrato tipo C do Café em Nova Iorque e baixas em suco de laranja, algodão e soja. Na direção inversa, a prata valorizava 2,18%.

O comportamento baixista dos preços internacionais das commodities reflete o temor de que uma forte desaceleração do comércio mundial, já contratado pelo tarifaço, gere uma recessão na economia mundial. Num cenário de piora contínua de cenário (sem luz no fim do túnel) há a natural ânsia de reversão das posições futuras (os mercados de ações, moedas, commodities e títulos costumam operar muito alavancados). Daí, os tombos diários de mais de 5% e 10%. As quedas só não se acentuam ainda porque os circuitos são interrompidos (“circuit brake”) quando há fortes baixas.

Crise pode baixar inflação e juros no Brasil

O lado favorável deste cenário de desaceleração do comércio – em Minas diz-se que “a situação está de vaca desconhecer o bezerro” – é que a baixa nos preços industriais (refletidos no IPA industrial, da FGV) tende a se estender aos produtos agrícolas. A pesquisa Focus, encerrada sexta-feira e divulgada hoje pelo Banco Central mostrou desaceleração na previsão do IPCA deste ano e de 2026 e, a primeira baixa dos juros para 2026. O IPCA estimado para dezembro ficou estável em 5,65% na mediana das respostas de 145 instituições financeiras, consultorias e institutos de pesquisa. Mas, nas respostas dos últimos cinco dias úteis a previsão do IPCA deste ano caiu para 5,48% (ainda acima do teto da meta, de 4,50%). A Selic foi mantida em 15%.

As previsões para o ano que vem mostraram o IPCA estável em 4,50%, mas com queda para 4,42% nas respostas dos últimos cinco dias úteis. A novidade é que a expectativa de arrefecimento do dólar R$ 5,80 este ano e queda de R$ 6,00 para R$ 5,99 em 2026, com R$ 5,90 na mediana de cinco dias úteis, levaram a uma revisão para baixa na taxa Selic (estável em 12,50% em dezembro, mas com queda considerável nas respostas dos últimos cinco dias úteis, que apontava uma alta para 12,75% na semana anterior e agora indica uma baixa para 11,63% na mediana das respostas nos últimos cinco dias.

Crise no crédito a grande ameaça

O episódio do Banco Master, cuja crise de liquidez, devido à escalada do dólar e dos juros no Brasil, afetando o seu “funding” que pagava até140% do rendimento do CDI (geralmente um pouco abaixo da Selic, que saltou de 10,50% em maio-agosto do ano passado para 14,25% em março deste ano, não foi o prato principal do encontro do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, com os dirigentes dos quatro maiores bancos privados do país no sábado, em São Paulo.

A entrada do encontro com os presidentes do Itaú, do Bradesco, do Santander e do BTG-Pactual era as implicações da crise do Master, que está com a compra de 49% das ações com direito a voto por R$ 2 bilhões pelo BRB, do governo do Distrito Federal em exame pelo BC, dado seu impacto no Fundo Garantidor de Créditos (CDBs, depósitos e outros títulos de renda fixa são garantidos pelo FGC até R$ 250 mil), foi devidamente examinada em todas as implicações, com eventual diluição de risco sistêmico para os grandes bancos – para preservar os médios e pequenos bancos.

Mas o temor maior de Galípolo – e por isso foi ouvir os grandes bancos que costumam ter acesso ao mercado financeiro internacional – é que o aprofundamento da crise do tarifaço corte o crédito internacional ao Brasil e gere uma crise de liquidez no sistema. A situação só não está tão crítica porque a escalada do dólar, desde setembro, tornou os bancos brasileiros mais cautelosos na tomada de linhas de crédito. Mas em dezembro, o Banco Central teve de sacar das reservas cambiais para atender à maior demanda sazonal do fim de ano, com remessas para pacotes de viagens e lucros e dividendos.

Na crise asiática de 1997 e na crise financeira mundial de 2008, muitos bancos brasileiros ficaram asfixiados ao perder acesso a linhas de crédito (“as vacas não reconhecem os bezerros”). Na crise de 2008, o Unibanco teve que se fundir com o Itaú, depois de procurar o Bradesco, que não fechou negócio porque queria ter 100% do controle.

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