Despejo de pessoas jurídicas durante a pandemia
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É de conhecimento geral que a pandemia provocada pela covid-19, que desencadeou a crise médica, econômica e social sem precedentes na história brasileira, está afetando inúmeros empresários e, por consequência, os contratos de locação comercial.
A coluna de hoje é dedicada a você, que tem curiosidade sobre o tema; ou que se incluiu no vasto rol de empresários prejudicados, que estão receosos com a possibilidade de despejo por falta de pagamento durante a pandemia, o que agravaria, ainda mais, o trágico panorama.
Nesse contexto de incertezas, a lei do inquilinato nº 8.245 de 1991, legislação especial vigente que regulamenta o despejo em contratos de locação comercial, não tem muito a contribuir com respostas diretas, já que pensada e promulgada para o momento de estabilidade social.
Soa natural que haja alteração nas relações contratuais em locações comerciais, para buscar a paridade entre as partes, de modo a proteger o locatário diante de possível redução do poder de pagamento e preservar o recebimento do locador, já que as atividades empresarias não essenciais foram cessadas ou sofreram restrições ante à iniciativa governamental de auxiliar no isolamento social e coibir o avanço da pandemia.
Deste modo, muitos locatários acabaram impossibilitados de arcar com os valores pactuados contratualmente, já que, enquanto estiverem na posse do imóvel, são responsáveis pelo pagamento do aluguel, mesmo que a atividade comercial esteja suspensa por Decreto.
A resposta legislativa atual, conforme visto na coluna da semana anterior, foi através do Projeto de Lei nº 827/2020, recém aprovado na Câmara dos Deputados, no dia 14 de julho de 2021, que está aguardando a sanção presidencial para impedir ordens de despejo, até o fim deste ano, de imóveis comerciais, com aluguel mensal de até R$ 1.200,00.
Contudo, apesar da tentativa de se preservar a segurança jurídica, mediante o estabelecimento de um critério objetivo, para evitar o despejo de imóvel comercial, que é a determinação do valor do aluguel máximo de R$ 1.200,00, o “tiro pode sair pela culatra”, uma vez que, se levada a ferro e fogo, a própria legislação pode causar inúmeras injustiças, provocando que as atividades comercias cessem, gerando desemprego em massa.
Isto porque, ao invés de estabelecer o teto máximo de até de R$ 1.200,00, dever-se-ia destacar a importância das características do caso concreto, a fim de analisar a prevalência de direitos, deveres e garantias, mormente em um país de dimensões continentais como o Brasil, com exacerbada variação de preços locacionais em cada região, em cada município, de bairro para bairro e até de rua para rua, de modo que o critério legal deverá ser analisado como ponto de partida, com observância das peculiaridades de cada contrato, tais quais a região onde o imóvel se encontra, as atividades da empresa, número de funcionários, importância do ponto locado, dentre outros.
Esses fatores somados tornam ilógico considerar somente o critério econômico como balizador da suspensão do despejo, demonstrando a insuficiência da legislação que, sequer, entrou em vigor.
A discrepância nos preços médios dos valores locatícios, por metro quadrado é gritante, por exemplo: no último informe, de abril de 2021, o índice “FipeZap”, que acompanha os preços médios de locação de imóveis no país, chegou à conclusão de que, em São Paulo, o preço médio é de R$ 44,36, enquanto em Curitiba R$ 26,70.
E não é só! Se considerados os comparativos por zona, distrito ou bairro, os números são ainda mais impactantes, pois o preço médio de locação, na cidade de São Paulo, no bairro Cidade Jardim é de R$ 89,71, enquanto no bairro do Jaraguá é de R$ 20,28. Já na cidade do Rio de Janeiro o bairro Leblon, tem o valor médio de R$ 135,60, enquanto a Penha, R$ 15,79.
Sendo assim, a análise da possibilidade ou não de despejo das pessoas jurídicas em meio à pandemia deve ter parâmetros maiores do que os valores dos alugueis, pois há outros direitos e garantias, que devem ser respeitados, como a função social da empresa e o equilíbrio contratual, pois não se pode perder de vista a importância da atividade empresária, como geradora de empregos e produtora de bens e serviços.
Portanto, a lógica deve ser pensada caso a caso e, por mais que os alugueis sejam superiores ao patamar de R$ 1.200,00, isso não quer dizer, necessariamente, que haverá o despejo, devido à possível prevalência de outros direitos além dos interesses patrimoniais do locador.
Na semana seguinte trataremos da ação revisional, que é um dos caminhos possíveis para tentar ajustar os valores nos contatos de locação.