'Me basta saber que tenho o mar por perto', diz Adriana Calcanhotto
Jaime Gonçalves Filho, JB Online
RIO - Areia, sol e praia não estão entre os grandes amores da cantora e compositora Adriana Calcanhotto, que pôs na praça seu oitavo disco, intitulado Maré. A antítese aparente se desfaz na segunda linha deste texto, já que Adriana afirma que foi o desejo de ter o mar por perto que a aproximou do Rio.
- Eu gosto de mergulhar, andar de caiaque. E quando viajo, é aqui que me sinto bem, menos aflita. Já me basta saber que tenho o mar por perto. Ou melhor, que estou perto dele disse Adriana, durante coletiva de imprensa concedida em uma suíte de hotel de frente para o mar de São Conrado, na Zona Sul do Rio.
A pelo menos três álbuns que, a cada novo disco, Adriana Calcanhotto dá saltos enormes em relações os respectivos trabalhos anteriores. Maré confirma a regra. Aqui o processo de sofisticação se acentua, tanto melódica quanto poeticamente, cercando-se de parceiros dispares e complementares.
E a sofisticação se dá sem que ela precise abrir mão de sua popularidade, seguindo assim a máxima de Oswald de Andrade: a massa ainda vai comer o biscoito fino que fabrico . Com Maré, isso nunca esteve tão próximo.
Muitas semelhanças, sonoridades distintas
Segundo de uma trilogia iniciada com Marítimo, lançado há dez anos, este novo vê-se em um intenso jogo de espelho com aquele outro.
- Quando eu fiz o primeiro, eu não sabia que era uma trilogia. Eu não paro para fazer o disco, compor para o disco tal. Então, só a partir de determinado momento é que eu percebi que esse disco tinha um eixo parecido ao outro faz a conecção.
As semelhanças são muitas. Se Marítimo tinha Dorival Caymmi em Quem vem pra beira do mar; em Maré há a regravação de Sargaço mar. Se em Marítimo ela burilava a pérola perdida Mais Feliz, de Dé, Bebel Gilberto e Cazuza; em Maré a trinca retorna com Mulher sem razão; se no primeiro havia a faixa-ode Vamos comer Caetano, no segundo o compositor baiano surge como co-autor, junto com Ferreira Gullar, na canção Por onde andarás.
Adriana diz que as principais diferenças estão restritas ao conceito sonoro. No novo álbum, a compositora consolidou sua aproximação com o trio +2, formado por Moreno Veloso, Kassin e Domenico, que já havia se insinuado no álbum Cantada e em uma turnê que passou pela Espanha e Japão.
- O Marítimo apontava para vários horizontes, tinha mais possibilidades sonoras, uma diversidade muito maior. O Maré é mais condensado, mais fechadinho, musicalmente mais resolvido explica.
'Sou fã da guitarra do Arto'
O starte inicial de Maré começou, segundo Adriana, depois dela ter visto Marina Lima cantar a canção Três, uma das faixas do disco.
- Eu estava zapeando e quando passei pelo programa ela estava começando. Fui achando tudo bom, todos os versos, tudo. Ali decidi que queria gravar um disco para gravar aquela música.
Maré tem produção de Arto Lindsey, que já produziu álbuns de Caetano Veloso (Estrangeiro e Circulado de fulô) e Marisa Monte (Mais e Memórias, crônicas e declarações de amor). Adriana diz que o convite foi feito por ser afinidade com os trabalhos de Arto e que o encontro demorou a acontecer por incompatibilidade de agendas.
- Desse vez, ele estava novamente ocupado, mas eu resolvi esperar. Sou fã dele e da guitarra dele. Ele tem uma maneira de trabalhar própria, é quase como se ficasse invisível no estúdio. Ele deixa os músicos trabalharem para ver no que vai dar e apara as arestas, mas não tenta imprimir um estilo forçadamente.