Filme brasileiro é aplaudido em Veneza

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Portal Terra

VENEZA - Um dos dois títulos concorrentes da seção paralela Horizontes, o filme "Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo" foi exibido para público pagante e jornalistas que não assistiram a sessão reservada a imprensa logo pela manhã. Como esta rivaliza com o horário dedicado a concorrentes da competição oficial, e registrou público minguado, a segunda acabou por ser um bom termômetro de recepção à fita de Karim Aïnouz e Marcelo Gomes. Na sala Darsena, metade dos 1.300 lugares estava ocupado e houve aplausos calorosos ao final. Há ainda mais uma sessão neste sábado (5). Oficialmente, Veneza reconhece o trabalho como um documentário. Sua origem pode ser essa, mas os diretores tratam seu trabalho como ficção. A Orizzonti premia separadamente ficção e documentário.

Nesta tarde, os diretores conversaram em coletiva com os jornalistas. Explicaram, como o Terra já destacou na entrevista realizada há uma semana, que o projeto teve início há uma década quando os dois realizadores coletaram variadas imagens do interior do Nordeste. Karim é cearense e Marcelo, pernambucano, ambos com família vinda do sertão para viver nas respectivas capitais no litoral. Queriam, ao colher esse material em 1999, conhecer a região que é mítica para o cinema brasileiro pelos menos desde Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos. De lá para cá, eles se tornaram parceiros nos roteiros dos respectivos filmes, O Céu de Suely, de Karim, e Cinema, Aspirinas e Urubus, de Gomes.

O filme se tornou a montagem das imagens colhidas no percurso nordestino em variadas técnicas, como o digital, o super-8 e a bitola de 16 milímetros.

- Para não ficar uma leitura sem sentido para o espectador, criamos a figura de um narrador, um geólogo que viaja e comenta suas impressões como num diário - disse Karim.

O recurso diverso é que os diretores optaram pela voz em off, ou seja, sem a presença física do ator em cena (no caso, a voz de Irandhir Santos). O diretor cearense ainda apontou que não gosta de utilizar o termo sertão para designar a região nordestina em foco.

- Prefiro 'desertão', porque para nós foi mesmo como atravessar um deserto imenso para reencontrar nossas memórias.

Também veio a tona a questão de uma falsa condição das imagens utilizadas no filme, truques que parecem sugerir uma adaptação proposital para parecer cenas ficcionais. Um exemplo pode ser detectado na conversa do protagonista José Renato com uma prostituta. Na origem, era voz de Karim que estava ali, agora trocada para a do ator.

- Nós assumimos essa falsidade, mas para nós a questão não é essa e sim saber mentir bem; esse filme é uma colagem, que para mim pode ser uma caminho para o cinema em tempos de crise, quem sabe um não cinema.