'Besouro' chega sexta-feira aos cinemas

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Carlos Helí de Almeida, Jornal do Brasil

RIO DE JANEIRO - Protagonizado por um herói negro do século passado e ambientado no universo da capoeira e do candomblé, Besouro chega sexta-feira aos cinemas disposto a derrubar vários preconceitos do público brasileiro de uma vez só. Centrado na história de Besouro Mangangá, tido como o maior capoeirista que o Brasil já conheceu, o longa-metragem de estreia do publicitário carioca (radicado em São Paulo) João Daniel Tikhomiroff desembarca no circuito respaldado por uma inédita e bem-sucedida de campanha na internet, que atraiu milhares de pessoas para um blog e um link no YouTube, repleto de vídeos de bastidores e trailers da produção. Empurrão essencial para uma produção de R$ 10 milhões, em parte consumidos em efeitos especiais que lembram as coreografias de filmes como O tigre e o dragão (2000), e protagonizado por um elenco de desconhecidos do grande público.

A internet alçou o voo de Besouro. Foi uma ferramenta importantíssima para nossa comunicação, que continuará mesmo depois da estreia do filme avisa o diretor de 59 anos, em entrevista ao Jornal do Brasil.

Em que momento a ideia de uma campanha virtual para o filme tomou forma?

Um pouco antes do início das filmagens, no segundo semestre de 2008, traçamos o plano de comunicação e percebemos que, por se tratar de uma produção repleta de peculiaridades, deveria ser compartilhada de alguma forma com o público. Foi então que nasceu a ideia de fazer um blog do filme, com registro de todas as etapas do processo. O diferencial do blog se deu com o seu formato. O conteúdo não era feito pelo diretor e equipe, mas por um jornalista que acompanhou as oito semanas de filmagem. Com o lançamento do blog, começamos a sentir a expectativa do público e, por isso mesmo, exploramos as redes sociais ao máximo. Criamos uma verdadeira legião de seguidores de Besouro, de tribos diversas: de amantes da capoeira a estudantes de cinema. Em 10 dias no ar, o trailer quebrou recorde de acesso de filmes nacionais. Sem contar as solicitações de estrangeiros perguntando sobre o seu lançamento no exterior. A internet alçou o voo de Besouro. Foi uma ferramenta importantíssima, que continuará mesmo depois da estreia do filme.

Não teme que a curiosidade gerada pela internet não se esgote nela mesma?

De forma alguma. Na semana passada tivemos um bom exemplo nesse sentido. Um site especializado em cinema promoveu uma pré-estreia do filme em São Paulo, seguida de debate. Segundo o diretor do site, foi a pré-estreia mais concorrida feita em cinco anos. E durante o debate, o próprio público fazia as perguntas. Várias pessoas chegavam ao microfone somente para fazer um agradecimento, queriam parabenizar a equipe por ter feito Besouro, um divisor de águas para o cinema. Esses agradecimentos eram emocionantes, houve gente que chorou. Outra pergunta recorrente tinha a ver com a continuação do filme. O que a internet fez com Besouro é algo que me impressiona. Fiquei emocionado.

'Besouro', que fala de um herói negro, tem no elenco atores desconhecidos do público. Isso pode ser um complicador, do ponto de vista mercadológico?

O filme pedia esses elementos. Trabalhar com não-atores foi uma opção, já que eu precisava no filme de capoeiristas de verdade. Seria infinitamente melhor encontrar professores de capoeira, como é o caso do protagonista, Ailton Carmo, e ensiná-lo a vivenciar o personagem do que trabalhar com um ator famoso e ensinar a esse profissional a arte da capoeira. Isso não daria a veracidade que gostaria de ver nas telas. Sobre a questão de a narrativa falar de um herói negro, do século passado, isso me encanta. O Brasil é um país plural em todos os sentidos, inclusive na raça. Por que não homenagear os negros, a capoeira no cinema? Explorei os negros de forma diferente, pelos aspectos da beleza nunca feito antes no cinema nacional.

'Besouro' tem capoeira jogada ao estilo da ação de 'O tigre e o dragão'. As lutas foram coreografadas por um especialista estrangeiro. É uma forma de dar uma roupagem internacional a um filme brasileiro?

Como comentei antes, a capoeira seria o fio condutor da trama mas não o objeto principal dela. Precisava então que ela tivesse tanto elementos reais quanto toques de fantasia. Nada melhor do que trazer um especialista em cenas de ação para tornar possível esse desejo. Foi por isso que contatamos o chinês Huen Chiu Ku, o Dee Dee. Já havia visto algumas cenas de filmes sob o cuidado dele, como O tigre e o dragão, Kill Bill e O clã das adagas voadoras. Ele se incumbiu da missão de inserir cenas áreas ao universo da capoeira retratada em Besouro, o qual, segundo a lenda, é cercado de magia e misticismo. O resultado transmite realidade e emoção ao filme.

O filme mistura ação, romance e grandes doses de fantasia. Até que ponto ele é fiel ao livro que o originou?

O filme baseia-se em Feijoada no paraíso, do Marco Carvalho, mas não se prende a ele e nem aos personagens reais que fizeram parte da vida de Manoel Henrique Pereira, o Besouro. Trata-se de um filme sobre as lendas que cercam a época em que Besouro viveu, mas não é uma reconstituição histórica. É um filme de fantasia.

Muitos publicitários que fazem cinema trazem 'vícios' da publicidade. Isso é inevitável?

Diria que a publicidade me ajudou bastante na direção de Besouro. Justamente por ter passado 35 anos contando histórias em 30 segundos, aprendi o poder da síntese, tive oportunidade de experimentar recursos nos comerciais e trazê-los para o cinema. A publicidade me deu a maturidade para dirigir longas.

'Besouro' consumiu R$ 10 milhões e pelo menos uns quatro anos de sua vida. Pretende continuar fazendo filmes? Já tem algum novo projeto em vista?

Sim. Já tenho um próximo filme a caminho, estamos na fase de roteiro. O que posso adiantar é que não tem absolutamente nada a ver com Besouro. Será um romance satírico, contemporâneo, e que se passa no Sul do Brasil.