Déa Trancoso traz os sons do Vale Jequitinhonha ao Rio
Bernardo Costa, Jornal do Brasil
RIO DE JANEIRO - Um Brasil rico e original é revelado em disco na estreia fonográfica de Déa Trancoso. Natural do Vale do Jequitinhonha, a cantora imprimiu em Tum tum tum (Biscoito Fino) toda a diversidade cultural do sertão mineiro, onde ainda hoje a tradição das congadas, folias de reis e catopês se mantém firme. Buscando na memória de infância e adolescência temas folclóricos de sua terra, acrescidos por novas descobertas sonoras e rítmicas, Déa gravou 12 canções que remetem ao universo literário de Guimarães Rosa, ou à música de Vila-Lobos e Tom Jobim, por exemplo. O resultado, ela apresenta nesta quinta e sexta-feira ao público carioca, em shows na Caixa Cultural, ao lado de Cláudio Nucci, Vânia Lucas, Maurício Féres e Mariana Baltar.
Até chegar à gravadora, foram 16 anos de pesquisa de repertório e imersão na cultura popular do Vale do Jequitinhonha, um projeto que teve como alavanca uma provocação do percussionista Djalma Correa.
Já tinha assistindo a um documentário sobre o semba (dança vinda de Angola e Congo) na Espanha e voltei com a ideia de fazer algo a respeito explica Déa Trancoso. Foi quando o Djalma disse para fazermos o disco explorando o universo do semba, mas voltado para a cultura do Vale do Jequitinhonha.
A cantora cita o disco como um rito de passagem que coroa sua trajetória musical e de ligação com a cultura popular.
Vim de um sertão de um Brasil que pulsa. Desde a adolescência eu cantava nas reuniões que fazíamos na minha cidade natal, Almenara comenta. Fechávamos a rua e organizávamos cantorias. Gostava muito de cantar coisas do Elomar, que tinha Vinicius de Moraes como admirador.
Após a sugestão de Djalma, a cantora se empenhou em conhecer figuras representativas para a cultura popular do sertão mineiro, como o capitão de catopês João do Lino Mar. A recomendação, conta a cantora, partiu de Ow, uma entidade que a acompanha.
Este Exu disse que eu precisava de um mestre que tivesse corpo físico. Assim, fui ter com o João do Lino Mar, que, durante 60 anos, foi capitão de catopês, que é um braço indígena do congado e tem a missão de proteger a alegria descreve a cantora. Ele me introduziu nas danças e me orientou no disco, mas sem me dar ensinamentos. Eu tinha que participar e descobrir as coisas por mim mesma, como a forma de cantar.
Outra figura importante na gênese de Tum tum tum foi Egberto Guismonti, que fez o disco chegar até a Biscoito Fino. Foi ele quem escreveu o texto de apresentação do disco, no qual avaliza Tum tum tum como a receita do Jequitinhonha em forma de alegria de viver .
Ele gostou do disco, e se tornou uma espécie de padrinho para este trabalho. Acho que ele se identificou pelo compromisso com o Brasil, com as nossas coisas acredita Déa.
>> Em cartaz
Déa Trancoso
Caixa Cultural, Av. Almirante Barroso, 25, Centro (2544-4080).
5ª e 6ª, às 19h30.
R$ 10 e R$ 5 (meia)