Bancos tentam na Justiça evitar devolver recursos que a Americanas já pagou
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A Americanas confirmou em fato relevante encaminhado à CVM que ajuizou, com suas subsidiárias ST Importações Ltda, JSM Global S.Á.R.L. e B2W Digital Lux S.Á.R.L, pedido de recuperação judicial do Grupo Americanas na 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro.
No documento, a empresa afirma que, a despeito dos esforços e das medidas que a administração dos últimos dias, em conjunto com seus assessores financeiros e legais, para proteger a companhia dos efeitos decorrentes da descoberta de financiamentos de compras da dimensão de R$ 20 bilhões não adequadamente refletidos nas demonstrações financeiras de 30/9/2022, o conselho de administração aprovou o pedido em caráter de urgência, por unanimidade.
A decisão, segundo a Americanas, considerou os desafios que está enfrentando na interface com credores e fornecedores desde revelação das inconsistências contábeis; a necessidade de atendimento dos interesses de seus credores, acionistas e stakeholders; a posição de caixa que reduziu-se sobremaneira; e a necessidade de preservação da continuidade da oferta de serviços de qualidade.
No fato relevante, a Americanas afirma que o total dos créditos listados nos documentos protocolados com o pedido de RJ soma aproximadamente R$ 43 bilhões e que "o grupo de acionistas de referência informou ao presidente do conselho de administração que pretendem manter a liquidez da companhia em patamares que permitam o bom funcionamento da operação de todas as lojas, do seu canal digital, - americanas.com - , da Ame e suas demais coligadas".
A companhia disse ainda que mantém seu esforço na busca por uma solução com os seus credores e reafirma "a confiança que tem em sua capacidade operacional e comercial para que seja bem-sucedida na proposição e aprovação de um plano de recuperação que permita ganho de valor para a companhia e seus stakeholders".
A apresentação do pedido de RJ foi feita nos autos da Tutela de Urgência Cautelar ajuizada em 12 de janeiro e a administração pretende tomar as providências necessárias à efetivação do pedido de recuperação em todas as jurisdições que sejam necessárias. A medida será levada à Assembleia Geral da Companhia, a ser convocada.
Dinheiro de volta
Matheus Piovesana e Altamiro Silva Junior - Bancos credores que já receberam pelos empréstimos dados à Americanas agora pedem à Justiça para não terem que devolver os dinheiro de volta à varejista, que anunciou um rombo de R$ 20 bilhões na semana passada. Ao menos duas instituições - BTG Pactual e BV - questionam os efeitos da decisão em que a empresa, na prática, congelou os vencimentos antecipados de dívida. A alegação dos dois bancos é que ao menos parte da dívida já foi paga. Ao todo, são R$ 1,6 bilhão em disputa.
O BTG Pactual acumula três tentativas e conseguiu liminar na tarde de hoje para manter R$ 1,2 bilhão da Americanas em depósitos no banco, até julgamento de mandado de segurança que impetrou ontem. Desde o fim de semana, o BTG já havia feito duas petições para manter os recursos em seus cofres, as duas negadas.
Já o BV também solicitou que a liquidação de dívidas da Americanas junto ao banco não sejam atingidas pela decisão, proferida na última sexta-feira. Com as liquidações, o BV deixou de ser credor da companhia. Voltaria a ser, porém, caso tivesse de desfazer as operações.
Tanto o BTG quanto o BV declararam vencimento antecipado de dívidas da Americanas após o fato relevante da companhia, divulgado na última quarta-feira, 11. A varejista pediu a tutela de emergência ao Tribunal de Justiça do Rio na quinta, e obteve a proteção na sexta-feira. Neste período, os bancos liquidaram operações da varejista através de depósitos que a Americanas possuía em CDBs das instituições.
No caso do BV, além de operações de crédito, as operações incluíam contratos de fiança, em que o banco garantia a fornecedores o pagamento por produtos vendidos à empresa caso ela não pagasse. O BV pediu a exoneração, para não ser mais fiador da Americanas.
Congelados
A decisão da Justiça do Rio também evita alterações nos contratos financeiros firmados com a varejista. Isto significa que contratos prévios de risco sacado, operação que foi o estopim da crise da empresa, têm de ser mantidos, mesmo a contragosto dos bancos.
No caso do BTG, o contrato com a Americanas já previa o resgate de recursos da conta corrente da varejista ou em investimentos, para quitação do passivo. O contrato também definia que qualquer discussão será em câmara arbitral. Na segunda-feira, o BTG já pediu a instauração da arbitragem, em São Paulo.
A argumentação das defesas dos bancos tem sido a de que a Americanas quer os bônus de uma recuperação judicial, sob a proteção contra execuções de dívida, sem o ônus de negociar. Em uma recuperação judicial, o fim do processo é decretado apenas se os credores concordarem. Ao obter uma proteção que não é uma recuperação judicial, a empresa poderia negociar escapando a essa obrigação.
Para um advogado envolvido nas conversas, mais bancos devem entrar com ações judiciais contra a varejista, sobretudo se houver constatação de que o rombo foi decorrente de fraude. "Os bancos têm que fazer, é preciso uma reação."