Câmara dos Deputados aprova projeto que restaura voto de desempate do governo no Carf

Conselho Administrativo de Recursos Fiscais julga disputas entre contribuintes e o Fisco

Por GABRIEL MANSUR

Plenário da Câmara dos Deputados

Após concluir a votação da reforma tributária, a Câmara dos Deputados aprovou mais um projeto da agenda econômica na tarde desta sexta-feira (7). Trata-se do projeto de lei que restaura ao representante da Fazenda Nacional o voto de desempate no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A proposta foi aprovada na forma de substitutivo do relator, deputado Beto Pereira (PSDB-MS). Agora, o texto vai para o Senado.

O Carf julga disputas entre contribuintes e o Fisco. O projeto retoma o chamado “voto de qualidade” nos julgamentos do órgão, vinculado ao Ministério da Fazenda. O mecanismo estabelece que, em casos de empate, o presidente do colegiado deve desempatar. Como o cargo é reservado a um representante da Fazenda Nacional, em tese, será beneficiado o Fisco.

O voto de desempate foi invertido a favor do contribuinte em abril de 2020 pela Lei 13.988/20. As mudanças nas regras são uma parte central do pacote da área econômica para conseguir contornar a previsão de déficit público neste ano, de R$ 231,5 bilhões. Segundo a equipe econômica, o governo pode arrecadar até R$ 50 bilhões com as alterações originalmente propostas no projeto.

O Carf é a segunda e última instância de julgamento dos processos administrativos referentes à constituição do crédito tributário, administrado pela Receita Federal do Brasil, tendo composição paritária entre representantes dos contribuintes e da Fazenda Nacional.

Em janeiro, o governo publicou medida provisória que devolve ao governo o voto de desempate em decisões do Carf. Sem ser votada a tempo pelo Congresso, a MP, portanto, perdeu a validade em 1º de junho, sendo substituída agora pelo projeto de lei votado nesta sexta-feira.

Acordo entre Fazenda e OAB

Em seu parecer, o relator acatou parcialmente o acordo entre o governo e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o retorno do voto de desempate. A proposta foi encaminhada pela entidade para isentar de multa e de juros o contribuinte (geralmente grandes empresas) derrotado pelo voto de desempate do governo nos julgamentos do órgão.

As empresas derrotadas pelo voto de desempate do governo ficariam isentas da multa, pagando apenas a dívida principal e os juros. Caso a empresa pague o débito em até 90 dias, os juros também serão cancelados. Além disso, o Fisco não representará o contribuinte ao Ministério Público por crime tributário. Essa exclusão valerá para os casos já julgados pelo Carf e ainda pendentes de análise de mérito pelo Tribunal Regional Federal (TRE) competente na data da publicação da futura lei.

A dívida principal poderá ser dividida em até 12 parcelas, com as empresas abatendo prejuízos de anos anteriores, por meio de créditos da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ). Caso o contribuinte recorra à Justiça, volta a cobrança de multa e de juros.

Caso não concorde com a dispensa da multa e dos juros, o contribuinte pode recorrer à Justiça sem precisar apresentar uma garantia, como é feito hoje.

Na última versão, o relator incluiu a exigência de que a medida não será concedida aos contribuintes que, nos últimos 12 meses antes da ação, não tiveram a certidão de regularidade fiscal válida por mais de três meses, emitida pela Receita Federal e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

Esse acordo foi firmado após a OAB entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Medida Provisória 1160/23, que tratava do voto de desempate. A MP perdeu a vigência sem ser votada.

Recurso ao Carf

Pereira manteve o atual limite de alçada em 60 salários mínimos (79,2 mil), diferentemente do que o governo havia proposto no texto inicial, que previa 1.000 salários mínimos (1,32 milhão).

Limite de alçada é o valor mínimo da disputa que define a competência do Carf para julgar um processo administrativo — ou seja, é o valor a partir do qual o contribuinte pode recorrer ao conselho.

“Houve um apelo do setor produtivo, frentes parlamentares e diversas confederações, um questionamento muito grande sobre cercear um direito do contribuinte com limite de alçada de mil salários mínimos. O degrau era muito grande”, afirmou o relator.

CNI se manifesta

Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) classificou como "preocupante" a retomada do voto de qualidade.

"Aprovada em 2020, a Lei 13.988, que passou a aplicar a inaplicabilidade do voto, por parte do Fisco, no caso de desempate de julgamentos, havia sido um passo importante para se alcançar maior equilíbrio no tratamento dado aos contribuintes e ao Fisco nas discussões sobre matérias tributárias que estão no âmbito administrativo", afirmou.