Bancos fazem varredura nos balanços para ajustar provisões de risco de crédito em 2025

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Por GILBERTO MENEZES CÔRTES

Secas foram piores que enchentes no RS

Os bancos e demais instituições financeiras estão fazendo uma varredura nas suas carteiras de empréstimos, de títulos e valores mobiliários e operações com derivativos que podem ter impacto nos resultados de provisões já no 4º trimestre de 2024. É que, em 1º de janeiro de 2025, entram em vigor novas regras contábeis da International Financial Reporting Standard (IFRS 9) Financial Instruments e IFRS 7 Financial Instruments: Disclosures.

Apesar de a pesquisa feita pela diretoria de Fiscalização Financeira do Banco Central, comandada por Aílton Aquino, junto a 90 entidades, responsáveis por 84% das exposições de crédito do Sistema Financeiro Nacional (SFN), concluir que as novas regras devem obrigar um aumento de R$ 37,8 bilhões, uma elevação de 10,7% frente aos níveis atuais, o Banco Central, ao divulgar o “Relatório de Estabilidade Financeira” (REF), garantiu que as novas regras não afetarão os lucros.

As novas regras

A constituição de provisão para perdas esperadas associadas ao risco de crédito sofrerá alterações relevantes na forma de cálculo e no escopo de instrumentos a ela sujeitos. Os instrumentos financeiros representam mais de 70% dos ativos totais das instituições autorizadas a funcionar pelo BC.

O IFRS 9 delineia os conceitos e os critérios contábeis para classificação, mensuração, reconhecimento, baixa e provisionamento de instrumentos financeiros, bem como os critérios contábeis para designação e reconhecimento de hedge.

Já o IFRS 7 dispõe sobre os requerimentos de divulgação de informações que permitam avaliar a natureza e a relevância dos riscos resultantes das operações com instrumentos financeiros para a posição patrimonial e financeira e para o desempenho da instituição.

A mensuração de ativos e passivos financeiros está entre as mudanças mais relevantes. Inicialmente, esses instrumentos passam a ser avaliados pelo valor justo, acrescido ou deduzido dos custos de transação. Nos períodos subsequentes, os instrumentos serão objeto de reavaliação pelo valor justo ou pelo custo amortizado, de acordo com a sua classificação inicial. Adicionalmente, as receitas e os encargos passarão a ser apropriados periodicamente utilizando-se o método de juros efetivos, tornando o reconhecimento contábil mais próximo do fluxo financeiro das operações.

Há duas metodologias para as entidades estimarem as perdas esperadas associadas ao risco de crédito: a metodologia completa e a metodologia simplificada. Na metodologia completa, as perdas esperadas são avaliadas considerando a probabilidade de o instrumento ser caracterizado como AP e a expectativa de recuperação do instrumento. Esses parâmetros devem ser estimados de forma prospectiva, com base nas condições econômicas correntes e previstas, considerando os estágios em que os instrumentos estão alocados.

Na metodologia simplificada, as perdas esperadas são avaliadas a partir de fatores de risco da contraparte e do instrumento financeiro, considerando a eventual condição de ativo problemático do instrumento.

Para os instrumentos financeiros em que há requerimento de provisão nas regras contábeis atuais, o aumento estimado nas provisões é de R$ 31,8 bilhões (9,6% das provisões atuais desses instrumentos). Em relação aos instrumentos que passarão a ter requerimento de provisão para perdas esperadas associadas ao risco de crédito, o aumento estimado nas provisões é de R$ 6,0 bilhões (1,7% em relação às provisões atuais registradas para todos os instrumentos financeiros).

O BC ressalta que “por se tratar de um novo regime contábil, o aumento das provisões afetará o capital, mas não o resultado das entidades”. E acrescenta: “a adaptação às novas regras de contabilização de instrumentos financeiros não representa risco à estabilidade do SFN, embora deva haver aumento significativo de provisão em muitas entidades. De acordo com a pesquisa, as exposições de crédito estão concentradas em entidades com impactos de provisão inferiores a 20%”.

É que, apesar de grande parte das entidades que responderam à pesquisa indicarem um aumento de provisão para risco de crédito acima de 20%, suas exposições de crédito representam 10,8% das exposições das entidades participantes. Cerca de 35% das entidades reportaram impactos de provisão abaixo de 10% e representam mais de metade das exposições de crédito.

Além de constituir provisões em montantes correspondentes às perdas esperadas dos instrumentos financeiros, as entidades deverão observar níveis regulamentares de provisão para perdas incorridas e de provisão adicional para perdas esperadas. As entidades deverão registrar provisões para perdas incorridas para os ativos financeiros com atraso superior a noventa dias e para os ativos financeiros cuja contraparte seja pessoa jurídica em processo falimentar.

Além disso, as entidades que utilizam a metodologia simplificada deverão constituir, complementarmente à provisão para perdas incorridas, provisão adicional para perdas esperadas para operações de crédito, operações com característica de crédito, operações de arrendamento financeiro, valores a receber relativos a transações de pagamento com usuários finais e outros ativos financeiros originados em decorrência de renegociação dessas operações.

Os dados solicitados se referem à data-base junho de 2024 e incluem (i) operações de crédito e outras operações com característica de concessão de crédito; (ii) debêntures e outros Títulos e Valores Mobiliários (TVMs) com característica de concessão de crédito; (iii) demais ativos financeiros classificados como custo amortizado; (iv) garantias financeiras prestadas; (v) Haverá também aumento do escopo de instrumentos sujeitos à provisão para perdas esperadas.

As regras contábeis atuais preveem requerimento de provisão para operações de crédito e outras operações com característica de concessão de crédito, operações de arrendamento mercantil e garantias financeiras prestadas. As novas regras ampliam o leque de instrumentos financeiros sujeitos à provisão, passando a englobar os compromissos de crédito não canceláveis, os créditos a liberar e os ativos financeiros de forma geral, que incluem, por exemplo, debêntures e demais títulos privados.

Secas foram piores que enchentes no RS

Uma conclusão curiosa no REF é que os estragos das enchentes de abril-maio deste ano no Rio Grande do Sul causaram menos impacto no Sistema Financeiro Nacional e no PIB regional do que as estiagens de 2022 e 2023.

A contabilidade considerou que “os pagamentos de coberturas pelo Proagro, foram consideravelmente inferiores às perdas provocadas por secas em anos anteriores. Apesar da relevância da agropecuária para a economia gaúcha, o impacto da calamidade para esse setor foi limitado, pois as enchentes ocorreram após a maior parte da colheita”.

Segundo o Banco Central, “até setembro de 2024, as perdas com os pagamentos de coberturas pelo Proagro somam R$ 450 milhões. Esse valor está bem abaixo dos R$ 6,4 bilhões pagos em 2022 e dos R$ 10,5 bilhões pagos em 2023 em coberturas pelo Proagro decorrentes dos impactos da seca”.