Superações e desafios

Por PEDRO RODRIGUES

Kevin Crescenzi (no centro da foto) é um dos principais jogadores do Paulistano

Nesta entrevista exclusiva, conversamos com Kevin Crescenzi, um dos principais nomes do Paulistano, que vive uma de suas melhores fases no basquete brasileiro. Aos 31 anos, o jogador norte-americano compartilha as experiências de sua carreira versátil e a jornada que o levou a se tornar um dos "closers" mais confiáveis do campeonato.

Nesta temporada NBB 24-25, ele encara um papel de liderança em uma equipe jovem e, mais uma vez, busca mostrar que tem o que é preciso para decidir nos momentos de maior pressão. Com seu carisma e humildade, Kevin reflete sobre o que é ser um "underdog", os desafios de ser subestimado e o segredo para manter o foco quando tudo depende de um último arremesso.

 

Nas Quadras: Primeiramente, muito obrigado por aceitar participar aqui com a gente! Queria começar falando um pouco sobre o Paulistano e suas expectativas para a temporada 24-25 do NBB. O que podemos esperar do time? Alguma novidade ou surpresa reservada para esta temporada, especialmente depois de vocês terem surpreendido bastante no ano passado?

Crescenzi: Antes de tudo, eu que agradeço pelo convite! Eu acredito que sim, teremos várias surpresas nesta temporada. O que me faz dizer isso é a evolução dos times no campeonato. Historicamente, tínhamos quatro equipes que se destacavam e um nível intermediário com outros times. Mas, neste ano, esses níveis estão mais próximos. Já estamos vendo algumas surpresas – inclusive conosco. E isso só reforça a ideia de que será uma temporada diferente, com muitos jogos imprevisíveis.
Acredito que veremos bastante equilíbrio, com times de menor expressão vencendo os favoritos. Esse cenário pode impactar bastante na classificação, especialmente quando chegarmos aos playoffs. Será crucial para cada equipe manter uma constância ao longo da temporada. Na minha opinião, o time que conseguir ser mais consistente e evitar oscilações terá grandes chances de ir longe no campeonato.

 

O Paulistano hoje é considerado um dos times mais equilibrados do campeonato, e conta com um dos melhores técnicos do Brasil. Mas, ao mesmo tempo, há uma percepção de que vocês são subestimados pela crítica e pelos seguidores do NBB. Como você lida com essa visão?

Sinto que sim, somos subestimados, especialmente por termos uma equipe jovem no papel. É natural que, com jogadores jovens, ocorram oscilações, e isso acaba alimentando essa percepção. Mas, pessoalmente, ser subestimado não me incomoda – pelo contrário, acho que até serve como motivação extra. Quem não gosta de uma história de “azarão”, não é? Então, para mim, isso é quase um incentivo para provar o contrário. E acredito que os outros jogadores também encaram dessa forma, já que essa cultura de “moleques não vão fazer nada” ainda persiste no basquete brasileiro.

E, na verdade, isso não nos atrapalha. Superar essa visão é algo que discutimos constantemente, e o Dema [Demétrius, do Paulistano], nosso técnico, reforça muito esse ponto. Ele sempre diz que precisamos fazer mais do que o esperado, ir além. O objetivo é que o Paulistano deixe de ser uma surpresa e passe a ser uma equipe firme, respeitada. E isso envolve a conquista pessoal e coletiva, pois muitos aqui também buscam crescer na carreira e sonham com melhores oportunidades. Então, todos temos essa mentalidade de provar que somos capazes e de ir além das expectativas.

 

Vamos falar um pouco sobre a sua trajetória, que é bem versátil e marcada por muita adaptação. Ao longo da sua carreira no NBB, você passou por várias "personagens" em quadra. Começou na Sorocabana, ainda se adaptando ao país, depois foi para o Flamengo, onde assumiu um papel mais defensivo, e foi fundamental no título de 2019 pelo Flamengo, onde começou como titular na final. Agora, no Paulistano, você é o "closer", aquele que fecha os jogos. Qual o segredo para ajustar seu estilo a tantos sistemas de jogo diferentes? Como é ser o defensor em um time, o pontuador em outro, e manter essa adaptabilidade?

Acho que o segredo é simples: eu quero estar na quadra, sempre. Com o tempo, você aprende o que cada técnico espera e adapta seu jogo para atender a essas necessidades. No começo, eu sofri bastante, principalmente porque mudei de time várias vezes (Sorocaba, Flamengo, Bauru, Unifacisa e Paulistano), e demorava um tempo para entender o que o treinador esperava. E aí, quando finalmente me ajustava, já estava indo para outro lugar. Essa constante mudança foi um desafio.

Quando fui para o Flamengo, lembro que o Gustavinho [Gustavo de Conti, do Flamengo], nosso técnico, precisava de alguém para marcar, não para pontuar ou criar jogadas. No começo das finais, nem joguei, mas a equipe estava com dificuldade de marcar o David Jackson. Então, no vestiário, o Gustavinho falou comigo e deixou claro que eu tinha que focar em defender. Fiz meu papel de marcador, e isso nos ajudou.

Depois, no Bauru, o Dema esperava que eu assumisse um papel mais ofensivo, mas ainda carregava a mentalidade defensiva do Flamengo. Não consegui me destacar tanto como ele esperava, e acho que ele ficou um pouco desapontado. Porém, ele viu meu potencial e, anos depois, quando cheguei ao Paulistano, ele já sabia o tipo de jogador que eu poderia ser e me trouxe para um papel mais de líder, um finalizador de jogadas.

Hoje, no Paulistano, estou mais estável, no meu terceiro ano aqui, o que permite me sentir em casa e jogar meu melhor basquete. Essa estabilidade me ajudou a crescer em quadra. Então, acho que o segredo é aprender o que o técnico valoriza e fazer o máximo para cumprir esse papel da melhor forma possível.

 

Quando eu falei que você é o "closer", o jogador que fecha os jogos, isso significa que é você quem carrega a maior pressão. Tenho em mente dois momentos desafiadores: Pelo Flamengo, a final contra Franca e agora pelo Paulistano, o jogo contra o Vasco em São Januário. O que passa pela sua cabeça nesses instantes? Como você consegue isolar o barulho ao redor e manter o foco?

Bom, acho que, no meu caso, estou na melhor posição possível para ser o "clutch player", aquele que decide nos momentos mais críticos. Isso pode parecer assustador para alguns, mas para mim acaba facilitando o trabalho. Como nossa equipe é jovem, isso praticamente define meu papel: é esperado que eu assuma esses arremessos decisivos. E isso é libertador, porque não preciso me preocupar com o "e se" do erro – estou ali para tentar e para correr o risco.

Em muitos casos, quanto menos tempo você tem no cronômetro, mais focado e confiante você fica. A responsabilidade de arremessar nos últimos segundos acaba se tornando algo natural, e é incrível como muitos desses arremessos difíceis acabam entrando. O apoio da equipe e do Dema, nosso técnico, é fundamental para isso. Ele sempre me fala: “O último lance é seu; vá lá e finalize.” E essa confiança da equipe em mim faz tudo ficar mais leve, porque sei que eles acreditam no meu potencial para decidir.

É curioso, porque nem sempre eu tive essa consciência de ser um jogador para esses momentos, de ser um finalizador. Descobri essa força em mim nos últimos anos, mesmo agora, aos 31 anos, e é algo de que tenho muito orgulho. Cada jogador tem seu próprio ponto forte, e saber que eu sou um "closer" é algo que me motiva. Então, com o apoio do time e do técnico, esses momentos de pressão se tornam mais fáceis, de certa forma.