Eldar Djangirov em tempo de jazz e no rigor da música erudita

Por Luiz Orlando Carneiro

Em 2005, a Sony Classical lançou o CD Eldar – estreia no mercado jazzístico do pianista-prodígio Eldar Djangirov, então com 18 anos, surgido dos confins da ex-União Soviética (Quirguistão), descoberto e levado para os Estados Unidos, juntamente com a família, por um jazzófilo rico de Nova York.

Em julho daquele ano, escrevi neste espaço: “Quando o pianista Eldar Djangirov detona e transforma em centelhas e clarões alucinantes a melodia e os acordes de Sweet Georgia Brown, tem-se a impressão de que Oscar Peterson, totalmente recuperado do derrame sofrido em 1993, voltou a deslizar os dez dedos pelas 88 teclas de seu Bösendorfer, à frente de um trio com o notável John Patitucci (baixo) e Todd Strait (bateria)”.

Oito anos e quatro álbuns depois, o ex-garoto-prodígio, cada vez mais assombroso em matéria de virtuosismo, reaparece em dois discos editados pela Motéma, gravados em setembro do ano passado, numa mesma semana, em dois estúdios diferentes. E - o que ainda é mais raro - expressando-se com maestria em duas linguagens tidas como impraticáveis pelo mesmo intérprete, pelo menos até a adesão ao jazz, na década de 1960, de Friedrich Gulda (1930-2000) e de André Prévin (hoje com 84 anos).

Breakthrough é uma seleção de 11 faixas do trio que Eldar comanda desde Virtue (Sony Masterworks, 2009), com Armando Gola (baixos elétrico e acústico) e Ludwig Afonso (bateria).Bach/Brahms/Prokofiev, por sua vez, contém, em sequência, interpretações à la lettre das seguintes composições daqueles três “santos” da música erudita dos séculos XVIII, XIX e XX, respectivamente: aPartita nº 2, em dó menor (BWV 826); as Oito Peças (Op. 76); a Sonata nº 7, em si bemol maior (Op. 83). E, como rapidíssimo encore, um arranjo do Voo do besouro, de Rimsky-Korsakov.

Em Breakthrough, Eldar assina seis peças: a faixa-título (10m), a mais longa do CD, na qual o trio vira quarteto com o convidado especial Chris Potter (sax tenor); Point of view redux (7m55), um remakecascateante do tema original que ele gravou com o saxofonista Michael Brecker (1949-2007) no álbum EldarIn pursuit (6m50); Hope (7m50); Tokyo pulse (7m40); Blink (8m45), uma “viagem” altamente percussiva, com a adesão do vibrafonista Joe Locke.

As outras cinco faixas são: As mais românticas What I'll I do? (5m45), de Irving Berlin, com direito às escovinhas do baterista Afonso, e Good morning heartache (4m50), imortalizada por Billie Holiday, em solo; No moon at all (3m15), tema tão caro a Julie London como aos pianistas Brad Mehldau e Keith Jarrett, que o trio de Eldar recria em tempo mais vivo, com Armando Gola no baixo acústico; Morning bell (4m), da banda Radiohead; e Somebody loves me (5m49), de Gershwin, um empolgante diálogo entre as duas mãos do pianista, enriquecido pelos pratos do baterista.

Quanto ao CD Bach/Brahms/Prokofiev, limito-me a transcrever a opinião de Robert Cummings (Classical Net Review) referente, apenas, à execução, por Eldar, da Partita de Bach:

“O Bach de Djangirov é vivo e imaginativo em matéria de contraponto. Francamente, surpreendeu-me o fato de parecer tão congenitamente fluente e natural sua percepção de Bach. Fiz uma comparação com a Partita nº 2 interpretada por Murray Perahia na Sony (também tocada num piano moderno). Enquanto Perahia usa uma razoável dose de legato, Djangirov usa relativamente pouco pedal, soando às vezes quase como Glenn Gould; e onde Perahia frequentemente soa relaxado em sua busca de avaliar a riqueza da sutileza bachiana, Djangirov é impetuoso, quase precipitado, mas sempre elegante. É difícil bater Perahia neste repertório, mas Djangirov sai-se muito bem na comparação, e parece estar em casa ao tocar a música de Bach”. 

Pat Martino em São Paulo

A partir do próximo sábado (27/7), o lendário guitarrista Pat Martino apresenta-se em São Paulo, em pelo menos três shows. O primeiro no SESC Pompeia, o segundo na unidade da instituição em Araraquara (31/7) e o terceiro no palco da unidade de Ribeirão Preto (1º/8). Nascido há 68 anos na Filadélfia, Martino praticamente ressuscitou, em 1987, depois de ter sofrido aneurismas que o fizeram perder a memória, durante muto tempo. Ele integra o “olimpo” da guitarra jazzística, ao lado do vovô Jim Hall, de Bill Frisell. Pat Metheny, John Scofield, e dos mais novos Russell Malone e Kurt Rosenwinkel.

Martino vai tocar em duos e trios com alguns dos melhores especialistas brasileiros em matéria de violão, guitarra e bandolim. São eles: os guitarristas Heraldo Monte e Alemão, o violonista Zezo Ribeiro e o bandolinista Hamilton de Holanda. No programa, segundo Zezo Ribeiro, temas do próprio Martino, de Ivan Lins, Luiz Eça e, é claro, Tom Jobim. Mas também gemas do jazz moderno como All blues eBlue in green, de Miles Davis.