Abdullah Ibrahim comemora 80 anos no Carnegie Hall

Por Luiz Orlando Carneiro

Adolph Johannes Brand nasceu em Capetown, África do Sul, em 9 de outubro de 1934. Apesar do suplício do apartheid - a impiedosa segregação racial imposta pela minoria branca sul-africana de 1948 a 1994 - ele estudou piano, descobriu o jazz, adotou o nome de Dollar Brand, e tornou-se o primeiro jazzman africano de renome internacional.

Em 1963, exilado na Europa, foi descoberto por Duke Ellington num clube de Zurique, Suíça. O Duke ficou tão impressionado com a sua arte que promoveu a primeira gravação do trio de Brand (Duke Ellington presents the Dollar Brand Trio, Reprise, 1964). O lançamento do LP por um dos deuses do Olimpo do jazz abriu para o músico de Capetown as portas dos clubes e os palcos dos festivais especializados do mundo inteiro.

Em 1968, Dollar Brand converteu-se ao islamismo, e adotou o nome de Abdullah Ibrahim. Em 1990, Nelson Mandela, libertado do cárcere depois de 27 anos, convidou o já famoso pianista para retornar à África do Sul. O ex-Dollar Brand por lá ficou alguns anos. E foi ele quem abrilhantou, com sua música, a festa de posse de Mandela na presidência da República, em 1994. Nas últimas três décadas, as cidades em que descansa de suas tournées mundo afora são Nova York e Capetown.

No próximo dia 17, no Zanker Hall do Carnegie Hall de Nova York, o pianista-compositor Abdullah Ibrahim vai comemorar o 80º aniversário, num concerto solo. Um mês depois, sua agenda registra outro recital, no Royal Festival Hall, em Londres.

Inicialmente influenciado por Duke Ellington (o pianista) e pelas trouvailles assimétricas e politonais de Thelonious Monk, Abdullah Ibrahim tornou-se o grande intérprete da diáspora africana. Ele não buscou uma “fusão” da música caseira de Capetown com as harmonias dobebop ou com o fraseado fulgurante de um Oscar Peterson. Seu espírito zen conduziu-o à evocação cada vez mais meditativa de “imagens acústicas e do sentimento de paisagens perdidas/lembradas para criar expressões sonoras da terra natal”, como comentou a musicóloga americana Carol Müller.

Ian Carr, por sua vez, anotou (Jazz: The Rough Guide, Londres, 1995) que, na música de Ibrahim, “composição e estrutura são tão importantes como a improvisação; há uma grande variedade de ritmos e uma tremenda ressonância de ordem harmônica, melódica e emocional”.

Uma minidiscografia selecionada dessa grande figura do jazz moderno – tocando solo, à frente do seu grupo Ekaya ou cercado de big band – terá de incluir, obrigatoriamente, os seguintes álbuns:

Zimbabwe (Enja, 1983), com a primeira formação do Ekaya, em quarteto (Carlos Ward, sax alto, flauta).

Water from an ancient well (Enja/Tiptoe, 1985), com o Ekaya (septeto) integrado pelos saxofonistas Ward, Ricky Ford e Charles Davis, interpretando peças hoje famosas, como MandelaSong for Sathima e The wedding.

- Bombella (Sunnyside, 2008/09), na liderança da WDR Big Band de Colônia (Alemanha), com destaque para a recriação das duas primeiras composições acima citadas, além da faixa-título e de I mean you/For Monk – uma suíte de 14 minutos em homenagem a Thelonious Monk.

- Senzo (Sunnyside, 2008), primoroso recital solo, também gravado na Alemanha, com 22 “meditações” de Ibrahim, em “estado de graça”.

AZAR LAWRENCE

Recebi da agente do saxofonista Azar Lawrence, Linda G., mensagem reclamando de “omissões” na coluna aqui publicada no último dia 6/9, sob o título “Azar Lawrence merece, enfim, lançamento à suja altura”. A representante da Zarman Productions, de Los Angeles, escreveu que “Azar produziu mais de oito álbuns como líder, e tocou em outros 30 dignos de nota”. E que suja carreira tem sido “reconhecida” por publicações importantes, como o New York Times, a Downbeat e a JazzTimes.

Acho que ela não entendeu a review que fiz do excelente CD The seeker, recém-lançado. Eu escrevi que, finalmente, com o novo disco, ounder the radar sax tenor, de 61 anos, merecia, finalmente, um álbum “à altura de sua arte, como líder, instrumentista e compositor, numa etiqueta especializada de primeira linha”, no caso a Sunnyside. Seus outros álbuns mais recentes, na condição de líder, apareceram em etiquetas menores (indie), como a Furthermore.

Além disso, lembrei que, como sideman, Lawrence atuou com músicos da importância de McCoy Tiner e, até, de Miles Davis (Dark Magus, registro de um show de 1974 no Carnegie Hall).