Entrevista | Romário: “Aqui, se legisla muito pouco”
O polêmico ex-jogador e agora deputado critica a quantidade de medidas provisórias e diz que não liga para pressões nem para a imprensa
Romário continua o mesmo: polêmico e falando o que quer – mesmo como deputado federal pelo PSB do Rio. A postura de aprendiz no mundo da política não pode ser confundida com humildade, adverte o ex-jogador. Já envolto em controvérsias, afirma que se quisesse ir para a Espanha – em missão oficial da Câmara, mas que previa assistir a um jogo entre o Barcelona e o Real Madrid – não seria a pressão da imprensa que o impediria, apesar de argumentar que desistiu da viagem por causa de uma cirurgia no ombro – para retirada de um queloide. Por outro lado, apoia a instalação de uma CPI para investigar a CBF e garante que não se curva a pressões. Romário dá mostras de que está se habituando à nova empreitada quando diz já ter percebido que na Câmara se legisla pouco com uma pauta de votações repleta de medidas provisórias.
Você desistiu da viagem à Espanha para pôr fim à polêmica de que a visita ao Parlamento espanhol seria uma desculpa para assistir ao jogo Real Madrid x Barcelona?
Tenho uma cirurgia no ombro marcada para esta semana, e o cirurgião vai viajar no feriado, então teve que ser antecipada. Mas, se eu tivesse que viajar, arcaria com a minha despesa, porque é justo. O convite partiu da presidência da Câmara, acredito que deva ser oficial, e, por isso, seria bem normal que a Casa arcasse com os gastos. Quando entra o jogo, as pessoas confundem. Deixam de entender que é uma coisa oficial. Não fui porque não quero mais. Não é porque a imprensa questionou. E, se tivesse que ir, seria um prazer ver o Barcelona ganhar de novo do Real Madrid.
Em dois meses de mandato você já se envolveu em polêmicas. A primeira delas foi ter faltado à primeira sessão da Câmara este ano para jogar bola na praia. Na última semana, voltou às manchetes por ter nomeado uma atriz e um amigo de infância para seu gabinete. É questão de estilo?
Eu tenho certeza de que, definitivamente, o meu nome vende. Minha relação com a imprensa é a seguinte: quando o assunto é negativo e poderia ser pequeno, se torna uma coisa enorme. Quando o negativo é grande, ele se torna estratosférico. Mas, se pegar a minha presença (em plenário), sou um dos únicos que nunca faltaram. No meu gabinete foram empossadas três pessoas que vão trabalhar comigo no Rio e que trabalharam durante os quatro meses de campanha. Um realmente é meu amigo de infância, outra é dentista e uma está estudando para ser atriz. Só quem pode trabalhar na política é cientista político? É claro que o ideal seria não sair nada disso. Mas aí não seria o Romário, seria mais um qualquer.
Você sempre teve uma imagem de bad boy. Há choque com a imagem de deputado?
O que eu fazia nunca me atrapalhava dentro de campo. Por esse meu jeito de gostar da noite, de ter convivido com muitas mulheres durante anos da minha vida, passei a ser bad boy. Quando vocês (da imprensa) me fazem uma pergunta, talvez estejam preparados para que eu responda o que vocês querem. Mas vou responder o que eu tenho que responder. Se a resposta que eu dou não agrada, o problema é seu. Isso, na concepção das pessoas, é ser bad boy. Então eu sou um bad boy. A fama e o dinheiro incomodam, principalmente num país onde a maioria dos jogadores de futebol sai das comunidades.
Você se sente uma celebridade no Congresso?
Eu me sentia novidade. Mas, agora, as pessoas já estão se acostumando. É claro que aqueles que não estão no dia a dia, como prefeitos e vereadores que vêm à Câmara pela primeira vez, têm aquela coisa da foto, do autógrafo. Mas, daqui a pouco, passo a ser um deputado normal. Eu continuo sendo ídolo, e meus colegas me veem assim, mas também me veem como um cara que tem votos como eles.
Como avalia os atrasos nas obras da Copa de 2014?
Isso é um problema. Estive com o ministro do Esporte, Orlando Silva, duas vezes. Ouvi dele que, em princípio, a maioria dos atrasos é normal. Mas, falando como Romário, brasileiro que torceu e fez para que o Mundial fosse aqui, tenho uma preocupação natural. Eles têm que pisar no acelerador.
Como vê a criação de uma CPI para investigar as ações da CBF para a Copa de 2014?
Eu, inclusive, assinei o requerimento da CPI. É uma obrigação apurar as denúncias. Independentemente de quem seja. Ricardo Teixeira é um cara a quem temos que agradecer pelo que fez em relação ao futebol nos últimos anos no Brasil. Teve alguns percalços, cometeu alguns erros, mas quem não comete? Se até o momento em que a CPI começar ele apresentar uma defesa convincente, vou ser o primeiro a retirar minha assinatura. Estamos falando de bilhões de reais que vão passar pela CBF por conta da Copa do Mundo.
Tem recebido pressão para ficar fora da CPI?
Eu jogava com 120 mil pessoas gritando no meu ouvido. Com todo respeito aos que se sentem pressionados, eu não me sinto assim. Quem vai ter problema ou não é o presidente da CBF.
Em que projetos está trabalhando?
A minha promessa de campanha é lutar para que eu consiga mudar algumas leis que existem com relação às pessoas com deficiência, principalmente, com relação à acessibilidade. Quero ver, primeiro, o que já existe na Casa. Pelo que reparei, aqui não tem como legislar. É só MP em cima de MP e votação de requerimento.
Em seu primeiro discurso na tribuna da Câmara, você pareceu bastante nervoso. Qual foi a sensação?
Talvez tenha sido o momento público mais nervoso da minha vida. Me preparei, achando que eu iria arrasar, como se estivesse no Maracanã. Mas deu errado, bateu o nervosismo. Mas, dali para a frente, senti que agora vai. Estou longe de saber de política como muitos que estão há muitos anos, mas tenho certeza de que vou pegar o mais rápido possível. Tenho ouvido muito, prestado muita atenção e estou feliz com minha performance até aqui.
Pelas suas declarações, é possível dizer que há uma certa dose de humildade no Romário?
O jogador sabia onde estava pisando, tinha 20 anos de experiência. Não ache que sou humilde, porque eu não sou. Sei onde estou e que sou um dos que sabem pouco. Mas tenho consciência da minha inteligência.
Como viu o rebaixamento do América no campeonato do Rio?
É uma administração totalmente errada desde o final do ano passado, quando saí. Não tem outro motivo. Quando um time como o América, que sempre jogou na primeira divisão, cai, tem alguma coisa. Se não tem patrocinador, é porque não tem credibilidade. Isso não acontece só com o América. Claro que o jogador tem culpa, mas, se ele não tem capacidade para vestir a camisa do América, a culpa não é dele. É de quem o colocou lá.
Qual sua ligação com o América hoje?
Nunca saí do América. Me desvinculei um pouco porque eleição é correr atrás de votos. A cabeça nova que assumiu decidiu fazer uma mudança, e deu tudo errado. Haverá nova eleição, existe um convite da maioria dos americanos que conheço para que eu venha como presidente. Talvez seja até chapa única. Mas ainda não tem nada definido.
Pensa em futuro político?
Estou vivendo o agora. Lá na frente, se a coisa acontecer, pode existir a possibilidade de querer ser deputado federal novamente.