O negócio do agrotóxico e o agronegócio

Não dá para falar de alimentação e/ou de segurança alimentar sem falar de agrotóxico. Afinal, um dos fundamentos do negócio do agronegócio é o negócio do agrotóxico

Por Chico Junior - Jornalista

Como se sabe, o atual governo brasileiro aprovou, nos primeiros sete meses deste ano, o registro de 262 agrotóxicos para serem usados na agricultura brasileira, incluindo aí, é claro, a produção de alimentos. Entre os produtos liberados está o sulfoxaflor, relacionado à redução de enxames de abelhas. Também como se sabe, as abelhas são fundamentais para a produção agrícola, pois são as grandes polinizadoras das plantas. Abelha extinta significa praticamente o fim da maior para parte dos nossos alimentos.

Não dá para falar de alimentação e/ou de segurança alimentar sem falar de agrotóxico. Afinal, um dos fundamentos do negócio do agronegócio é o negócio do agrotóxico.

Para se ter uma ideia, as mesmas multinacionais que lideram a produção de sementes comerciais no mundo são também as principais produtoras de agrotóxicos.

Em 2018 a Bayer alemã, produtora de agrotóxicos, comprou a norte-americana Monsanto, produtora de sementes, inclusive transgênicas. “Com a fusão, a Bayer se transformou na maior corporação agrícola do mundo, possuindo um terço do mercado global de sementes comerciais e um quarto do mercado de agrotóxicos”, informa o “Atlas do agronegócio”, lançado no ano passado no Brasil pela Fundação Heinrich Boll e pela Fundação Rosa Luxemburgo, em parceria com a Amigos da Terra Europa.

Em 2017, a americanas DuPont e Dow Chemical se fundiram na DowDuPont. E a chinesa ChemChina comprou a suíça Syngenta. Sempre negócios envolvendo bilhões de dólares. “Assim, os três conglomerados recém-formados devem dominar 60% do mercado de sementes comerciais e de agrotóxicos; Eles administrarão a produção e comercialização de quase todas as plantas geneticamente modificadas neste mercado”, ainda de acordo com o Atlas.

Voltando ao Brasil e à liberação recorde de agrotóxicos, considere-se que, informa reportagem da revista Época desta semana, “outros 2.200 estão na fila de aprovação do Ministério da Agricultura”. “Caso o ritmo siga igual, em dezembro o país terá aprovado mais de 500 novos registros”, ainda de acordo com a revista.

Embora ambientalistas e ativistas da segurança alimentar denunciem com frequência os problemas relacionados ao uso indiscriminado de agrotóxicos no Brasil, muitos deles banidos em outras partes do mundo, principalmente na Europa, é muito difícil mudar esse quadro. Impossível não é, mas é um processo muito demorado e que precisa da conscientização de toda a sociedade. Mas, é aquela história, resistir é preciso.

A política agrícola do governo Bolsonaro atende, principalmente, os interesses da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), a famosa bancada ruralista, que, com os seus cerca de 250 parlamentares, é a maior bancada do Congresso e tem até sete própria. E foi a FPA que indicou a atual ministra da Agricultura, a deputada federal Tereza Cristina (DEM-MS), considerada pelos ambientalistas como a “musa do veneno”.

Felizmente, a Europa tem pressionado o governo brasileiro a restringir o uso de agrotóxicos, alguns vetados naquele continente há mais de 15 anos. Um exemplo, mencionado na reportagem da Época, se refere ao suco de laranja Se os produtores continuarem a usar o inseticida dimetoato nos laranjais terão, simplesmente, que deixar o mercado europeu. Considerando que 70% de todas as exportações do setor de cítricos têm como destino a Europa...

A matéria de capa da Época é extensa, dez páginas, e é um alerta para o uso de agrotóxicos no Brasil. E conclui com o seguinte: “O governo tem por estratégia priorizar as demandas do agronegócio em detrimento da preservação ambiental, já cogitou publicamente acabar com a Anvisa e não tem planos de melhorar a fiscalização do uso de agrotóxicos pelos produtores rurais. Jair Bolsonaro e seu time de egressos da bancada ruralista podem ter boas intenções em tentar dinamizar o setor agrícola, mas é fundamental que que se estabeleçam os limites para a autonomia desses agentes no Brasil (...)