Matrículas em creches têm queda em São Paulo sob Covas
Pela primeira vez desde 2013, a cidade de São Paulo termina o semestre letivo com menos crianças matriculadas em creches municipais do que havia no semestre anterior.
Em 30 de junho de 2019, o portal de dados da Secretaria Municipal de Educação apontava que havia 333.832 crianças matriculadas em creches da rede paulistana. Em dezembro de 2018, o número era de 333.922 matriculados --redução de 90 vagas. A Folha de S.Paulo considerou apenas as matrículas efetivas no cálculo.
Há um déficit de 34.317 vagas de creche em São Paulo, segundo o último dado da prefeitura, de março deste ano.
A fim de comparação, o saldo entre o fim de 2017 e o meio de 2018 (mesmo período do ano anterior, portanto) foi de 17.338 novas matrículas. A última vez que houve redução foi entre o final de 2012 e o meio de 2013, primeiro semestre do governo Fernando Haddad (PT), com 2.553 vagas a menos.
Os dados de crianças matriculadas ao fim do primeiro semestre foram consultados pela Folha de S.Paulo no Sistema Escola Online (EOL) da Secretaria de Educação em 30 de junho.
A prefeitura afirma que os números do EOL poderão sofrer alguma alteração até a publicação do balanço trimestral, já que diretores podem enviar dados até 5 de julho.
A reportagem ouviu funcionários que passaram pela área de planejamento da Secretaria de Educação que disseram que a variação entre os valores presentes no EOL e o que aparece nos balanços é nenhuma ou apenas residual.
Os primeiros anos da atual gestão tucana em São Paulo, iniciada com João Doria em 2017 e assumida por Bruno Covas em 2018, foram prolíficos em termos de criação de vagas em creches. Sob a gestão do então secretário de Educação Alexandre Schneider, 49.743 novas matrículas foram geradas nas creches.
Em 2017, a atual administração assinou um acordo com o Tribunal de Justiça em que se comprometeu a criar 85.500 vagas em creches até dezembro de 2020. Esse era o número de vagas prometidas por Doria no seu Plano de Metas. O então prefeito também afirmou algumas vezes que zeraria a fila nas creches.
Para realizar o previsto nesse Termo de Ajustamento de Conduta, Covas terá que criar 35.847 vagas. O descumprimento do acordado pode resultar em multa e processo de improbidade administrativa contra os responsáveis.
Em janeiro de 2019, em movimentação que teve a busca de apoio político nas eleições de 2020 como fundamento, Covas demitiu Schneider e nomeou João Cury para o cargo de secretário de Educação.
No começo de junho, diante de pressão do agora governador Doria (que tem Cury como desafeto desde que ele decidiu apoiar Márcio França nas eleições de 2018) e da condenação do secretário em segunda instância por improbidade administrativa, Covas decidiu exonerar Cury, que deixou o cargo na quarta-feira (3). Nesta quinta, Bruno Caetano, ex-diretor-superintendente do Sebrae-SP, foi colocado no posto.
Especialistas consultados pela reportagem elencam diferentes explicações possíveis para a estagnação. Coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara afirma que o dado mostra "uma despriorização gravíssima da educação. Isso tem um impacto muito concreto, em primeiro lugar no direito da criança à educação. Em segundo lugar porque acaba por limitar radicalmente as estratégias de ocupação familiar. Os pais não conseguem se organizar para trabalhar ou estudar sem saber se o filho terá uma creche."
Alessandra Gotti, advogada especialista em educação, enfatiza a necessidade de se levar em conta os resultados positivos dos últimos anos. "Partimos de uma necessidade de 150 mil vagas para 85 mil. No ano passado, São Paulo já havia superado a meta do Plano Nacional de Educação e tinha 61% das crianças em creches seis anos antes do prazo", diz.
Membro de um comitê de monitoramento criado a partir de uma decisão judicial, de 2013, que condenou a prefeitura a zerar a fila por creche, Gotti enxerga uma "demanda pulverizada pelos distritos educacionais" após a melhora dos índices nos últimos anos, o que explicaria em parte a persistência da fila.
PREFEITURA DIZ QUE TEM AUMENTADO NÚMERO DE VAGAS
OUTRO LADO
Em nota, a Secretaria de Educação afirma que "a Folha apresenta números não consolidados, ou seja, os dados ainda não representam o primeiro semestre de 2019, já que as unidades de ensino possuem o prazo para o preenchimento da tabela disponível no Sistema de Escolas Online-EOL".
A nota diz que o número será publicado assim que todas as unidades preencherem a informação.
O texto da secretaria destaca o aumento no atendimento de 2018 para cá: "Os dados do primeiro trimestre de 2018, comparados com o primeiro trimestre de 2019, mostram que houve uma redução de 23,5 mil crianças na fila de creche --saindo de 57,8 mil em março de 2018 para 34,3 mil em março de 2019."
A reportagem solicitou duas vezes o número de Centros de Educação Infantil (CEIs) construídos e de novos convênios assinados em 2019. Nas respostas, a gestão Covas disse e repetiu que "no primeiro trimestre de 2018 eram 2.172 CEIs, que saltou para 2.356 no mesmo período em 2019."
A secretaria também destaca parceria com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo para promover a resolução extrajudicial de conflitos de crianças que aguardam vagas em creches; e o pagamento de 20% a mais sobre o que é pago para CEIs com até 59 crianças.