Governistas descartam votar este ano Programa de Direitos Humanos
Jornal do Brasil
BRASÍLIA - Líderes do governo no Congresso Nacional sinalizaram terça-feira que a crise instalada por causa de divergências em torno do Programa Nacional de Direitos Humanos pode ter sido desnecessária. Petistas descartaram a possibilidade da Câmara e do Senado analisarem ainda este ano as medidas previstas no programa. Embora o decreto que criou o plano contenha a previsão de envio de projetos de lei ao Congresso para regulamentar os principais pontos do texto, a base governista não acredita que os temas previstos no programa tenham condições de entrar na pauta do Legislativo nos próximos meses.
Eu não tenho expectativa que nós votemos essas matérias em 2010. Este ano, a prioridade é o pré-sal e os temas urgentes da política que nós temos que enfrentar, como as enchentes que atingiram o país deu o tom o líder do PT na Câmara, Cândido Vaccarezza (SP).
Na mesma linha do colega petista, a líder do partido no Senado, Ideli Salvatti (SC), disse que não há consenso na Casa para a discussão e votação de itens como descriminalização do aborto, união civil entre pessoas do mesmo sexo e mudanças na Lei de Anistia, todos previstos no programa de direitos humanos.
Em termos legislativos, nesse tipo de assunto, o Congresso é muito lento. Boa parte das matérias que teriam que vir do plano são controversas. A tendência é se arrastarem no Congresso analisou Ideli. Não são matérias que sequer podem colocar na mesma ótica oposição e governo. Há matérias de implicação de ordem religiosa, concepção de vida. Já temos projetos sobre esses temas no Congresso que nunca foram aprovados.
Além de afastar o Congresso da polêmica sobre o Programa de Direitos Humanos, líderes governistas também procuraram transferir para o Judiciário a responsabilidade sobre novas interpretações da Lei da Anistia. Uma ação da Ordem dos Advogados do Brasil questiona no Supremo Tribunal Federal a validade da lei para torturadores do regime militar.
Esse é assunto da Justiça, não é do governo. O que o governo tem que garantir é o direito à verdade, tornar público os arquivos da ditadura. Abrir os arquivos é uma posição que eu acho correta, e tem que ser feita. O passo adiante depende da Justiça afirmou Vaccarezza, antes de colocar em dúvida até mesmo o envio das medidas previstas no programa para o Congresso. Se (o programa) chegar na Câmara na forma que está, vamos aprimorá-lo. Agora, esse não será um debate para 2010.
Encontro
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu reunir quarta-feira pela manhã os ministros Nelson Jobim (Defesa) e Paulo Vanucchi (Direitos Humanos), as principais figuras das divergências dentro do governo em torno do programa. O encontro estava previsto para ocorrer ainda na noite de terça-feira, mas foi adiado porque Lula estaria cansado. Vannuchi chegou a conversar terça-feira por cerca de 20 minutos com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, sobre a polêmica. Segundo interlocutores do presidente Lula, a expectativa é que, durante o encontro, os ministros apresentem ajustes no texto para neutralizar os pontos de impasse em torno da proposta. O foco da crise é o sexto capítulo do plano, que trata da criação da chamada Comissão da Verdade para investigar agentes da repressão política durante que atuaram na ditadura militar. (Com agências)
ONGs e OAB pressionam STF por mudança na Lei de Anistia
Em meio à polêmica sobre o Programa de Direitos Humanos do governo federal que defende a investigação de militares responsáveis por crimes de tortura durante a ditadura militar (1964-1985) brasileira, entidades se articulam para pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a acatar uma nova interpretação da Lei de Anistia. O tribunal, que espera um parecer do procurador-geral da República sobre a lei, deve discutir o tema, que divide a cúpula do governo federal, nos próximos meses.
O manifesto apelo ao STF: não anistie torturadores , lançado há cerca de um mês pela Associação de Juízes para a Democracia, por exemplo, já reuniu 11 mil assinaturas em favor da investigação dos militares. Entre as personalidades que assinam o manifesto estão o cantor Chico Buarque, o filósofo Leandro Konder, o jurista Helio Bicudo, o ex-ministro Aloisio Nunes Ferreira e o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stedile.
O grupo defende que o STF acate a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em 2008, pedindo que o tribunal declare claramente que a anistia concedida pela lei 6.683 não se estende a crimes comuns praticados por agentes da repressão contra opositores políticos durante o regime militar .
Sem perdão
A OAB argumenta que tortura, assassinato e desaparecimento forçado são crimes de lesa-humanidade, portanto não podem ser objeto de anistia ou auto-anistia. Em carta encaminhada ao presidente do STF, Gilmar Mendes, a associação afirma que não há anistia para torturadores, sequestradores e assassinos dos opositores à ditadura militar .
Afastando a incidência da anistia aos torturadores, o Supremo Tribunal Federal fará cessar a degradação social, de parte considerável da população brasileira, que não tem acesso aos direitos essenciais da democracia e, nesta medida, o Brasil deixará de ser o país da América Latina que ainda aceita que a prática dos atos inumanos durante a ditadura militar possa ser beneficiada por anistia política , diz a entidade na carta. O manifesto será enviado ao ministro Eros Grau, do STF, relator da arguição apresentada pela OAB. O STF espera o parecer do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que analisa o caso desde fevereiro do ano passado.
Terça-feira, o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, anunciou que pretende apresentar uma reclamação formal ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) contra a demora do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, para emitir o parecer sobre a legalidade ou não da aplicação da Lei de Anistia para beneficiar policiais e militares que participaram de crimes de tortura, mortes e desaparecimentos forçados durante a ditadura. Gurgel está em férias. (Com agências)