Mensalão: Três ministros votam pela condenação de João Paulo Cunha
Ex-presidente da Câmara e ex-diretor do BB são réus por crimes de corrupção
O ministro Luiz Fux aderiu, totalmente, ao voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, na continuação do julgamento da ação penal do mensalão, na sessão do Supremo Tribunal desta segunda-feira, para condenar o deputado João Paulo Cunha (PT-SP), ex-presidente da Câmara dos Deputados, e Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil, pelos crimes de corrupção passiva, peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro. Assim, votou também pela condenação (corrupção ativa e peculato) dos réus Marcos Valério e seus sócios Ramón Hollerbach e Cristiano Paz.
No início da sessão, a ministra Rosa Weber — o primeiro integrante do STF a se pronunciar no mérito da Ação Penal 470, depois do relator e do revisor — tinha acompanhado Joaquim Barbosa na maior parte do seu voto, mas seguiu o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, no segundo caso de peculato que envolvia João Paulo Cunha, Pizzolato e os sócios das agências de publicidade SMP&B e DNA.
Rosa Weber
A ministra mais nova da Corte partiu do pressuposto de que corrupção, peculato e lavagem de dinheiro — como todos os pagamentos e recebimentos de propinas — “não se fazem sob a luz de holofotes”. Ou seja, ela afastou, assim como o ministro-relator, a necessidade de “ato de ofício” para consumar o peculato, e assinalou que a recepção por terceiro de dinheiro à guisa de propina, não descaracteriza o crime de corrupção passiva.
A ministra Rosa Weber deixou para “mais adiante”, no entanto, a leitura da parte do seu voto referente ao crime de lavagem de dinheiro de que são também acusados o ex-presidente da Câmara dos Deputados e os donos das agências publicitárias.
Luiz Fux
Num voto de mais de uma hora, Luiz Fux — o segundo a votar, na ordem inversa de antiguidade — fez uma longa introdução para falar da “complexidade” da ação penal do mensalão, tendo em vista o elevado número de réus e as diversas situações em que eles estão envolvidos. Destacou que o Direito brasileiro “repugna a hierarquia das provas, mas exige que o magistrado fundamente a sua convicção, ao fazer a valoração das provas”, procurando afastar a questão da premissa da presunção da inocência alegada pelos advogados dos réus em face da peça acusatória do Ministério Público que, segundo eles, não teria respeitado o princípio do contraditório.
Fux citou jurisprudência do STF para sublinhar que a prova do álibi cabe ao réu, sobretudo quando se trata de “megadelitos”, como ocorre na ação penal em julgamento. E acompanhou totalmente o voto de Joaquim Barbosa proferido na semana passada — referente, unicamente, aos desvios de dinheiro na Câmara dos Deputados e no Banco do Brasil — inclusive quanto à condenação de João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato por crime de lavagem de dinheiro (“simulação ou ocultação” de dinheiro recebido para auferir vantagem em função do cargo).
Voto do relator
No dia 16, Joaquim Barbosa tinha condenado João Paulo Cunha (PT), presidente da Câmara dos Deputados à época dos fatos, por corrupção passiva, peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro. Os réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano de Mello Paz — sócios das empresas de publicidade SMP&B e DNA— foram igualmente condenados pelo relator, por corrupção ativa e peculato.
O crime de lavagem praticado pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados ficou configurado, segundo o ministro-relator, pela recepção de R$ 50 mil em espécie (corrupção passiva), através de sua mulher, em 4 de setembro de 2003, com base numa operação em que a matriz do Banco Rural em Belo Horizonte enviou a ordem de pagamento para a agência em Brasília como se fosse para o próprio banco, havendo, no entanto, comunicação interna para que a quantia fosse entregue ao ex-parlamentar ou à sua esposa.
O primeiro crime de peculato, segundo Barbosa, ficou comprovado com a autorização dada por Cunha para a terceirização do contrato principal que a Câmara dos Deputados mantinha com a agência publicitária SMP&B (de Valério, Hollerbach e Cristiano Paz). Com base nessa autorização para pagar serviços de terceiros com recursos públicos, da ordem de quase R$ 11 milhões, apenas o percentual de 0,01% (R$ 17.091) foi realmente executado em serviços para a Câmara pelos terceirizados.
O outro crime de peculato atribuído ao ex-presidente da Câmara dos Deputados refere-se ao uso da empresa Idéia Fatos e Textos (IFT), do jornalista Luiz Costa Pinto — que era o assessor de imprensa de João Paulo Cunha — a fim de obter vantagens financeiras com o desvio de recursos públicos. O ministro Joaquim Barbosa acolheu a denúncia e a sustentação final do Ministério Público de que houve um desvio de R$ 252 mil em recursos públicos, dos quais João Paulo tinha a posse como presidente da Câmara, em proveito dos também réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Mello Paz.
Voto do revisor
O ministro Ricardo Lewandowski, revisor da ação penal, votou na última quinta-feira pela absolvição do deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) de todos os crimes em que foi enquadrado pelo procurador-geral da República, e pelos quais foi condenado no voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa: corrupção passiva, peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro.
Lewandowski divergiu totalmente do voto inicial do ministro-relator Joaquim Barbosa, favorável à condenação do réu por corrupção passiva. E também desqualificou a condenação do ex-presidente da Câmara dos Deputados, sob o argumento de que os fatos não ficaram devidamente comprovados.
Na primeira acusação, o parlamentar, depois de contratar a SMP&B para prestar serviços à Câmara, no valor de R$ 10.745.902, assinou cerca de 50 autorizações para subcontratações, o que teria resultado na terceirização de 99,9% do contrato, embora houvesse cláusula dispondo que a contratada poderia subcontratar outras empresas, “desde que mantida a preponderância da atuação da contratada na execução do objeto”.
O revisor também absolveu Cunha da acusação do segundo crime de peculato, que consistiria na contratação da agência IFT, de seu próprio assessor de imprensa, para prestar serviços à Câmara, e que não teriam sido prestados, beneficiando-se de dinheiro público do qual era gestor. Lewandowski também absolveu, consequentemente — nesta parte do julgamento — os réus Marcos Valério e seus sócios dos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro.
O ministro-revisor — nesta etapa do julgamento — só acompanhou o relator na condenação do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, por crimes de corrupção passiva, de peculato (duas vezes) e de lavagem de dinheiro.
O segundo ministro a votar no mérito da ação penal em julgamento, também somou o seu voto ao do relator pela condenação dos réus Marcos Valério e de seus principais sócios na empresa DNA, Cristiano Hollerbach e Cristiano de Mello Paz, pelos crimes de corrupção ativa e peculato (neste caso, como coautores).
Quanto à acusação de corrupção passiva, segundo Lewandowski, ficou comprovado nos autos ter Pizzolato recebido, em 15 de janeiro de 2004, a quantia de R$ 326.660,67, à guisa de “comissão”, por “serviços prestados” à empresa DNA, dos também réus Marcos Valério e seus sócios Cristiano Hollerbach e Cristiano de Mello Paz (corruptores ativos).
Ainda de acordo com o ministro-revisor, apesar de Pizzolato ter negado o recebimento de quantia superior a R$ 326 mil acondicionada num envelope pardo, os depoimentos demonstraram não resistir a uma análise mais detida a explicação de que o réu fez apenas um favor a Marcos Valério — e à agência DNA — ao receber de Belo Horizonte um envelope fechado para ser entregue a “uma pessoa do PT”. Esta pessoa, conforme Lewandowski, não foi jamais identificada.