RIO

Aumento de tarifa da Cedae resulta de erros do estado e do consórcio Águas do Rio

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Por CELINA CÔRTES

Publicado em 02/12/2024 às 12:11

Alterado em 02/12/2024 às 12:11

Fachada do edifício-sede da Cedae Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Era o dia 20 de abril de 2021, quando o plenário da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou o projeto de lei que autorizava a privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), por 41 votos favoráveis e 28 contra.

Quem bateu o martelo para o encerramento do leilão foi o então presidente, Jair Messias Bolsonaro, com o dedo de Paulo Guedes, seu ministro da Economia: "O Brasil vai retomar o crescimento. Nós vamos atravessar as duas ondas, a da pandemia que está aí e a ameaça econômica”, profetizou...

A Cedae, por sua vez, foi fundada em 1975 para prestar serviços de saneamento no estado do Rio de Janeiro como uma empresa estatal de economia mista, cujo maior acionista era o governo do estado.

A criação ocorreu em seguida à fusão dos Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, o que fundiu em uma só as três empresas que atuavam no setor: a Companhia de Saneamento do Estado do Rio de Janeiro (Sanerj), a Companhia Estadual de Águas da Guanabara (Cedag) e a Empresa de Saneamento do Estado da Guanabara (Esag).

O engenheiro Leonel Brizola – primeiro governador eleito, em 1982, para o estado do Rio, nos estertores da ditadura militar - terminou por garantir fornecimento de água à Baixada Fluminense, cujo abastecimento fora relegado até então (Leia Box).

Claro que o processo de privatização trouxe muito choro e ranger de dentes. Após a decisão da Alerj, servidores da companhia saíram em passeata rumo ao prédio da Cedae, na movimentadíssima Avenida Presidente Vargas, que chegou a ser fechada nos dois sentidos. Manifestantes se desentenderam com policiais, houve bombas e correria.

A venda da Cedae era uma das condições do Plano de Recuperação Fiscal, conforme acordo firmado em janeiro de 2021 com a União, que acarretaria a suspensão do pagamento da dívida do estado ao Governo Federal.

O executivo estadual previa um alívio de R$ 62 bilhões da dívida com a União por três anos. Com isso, a distribuição de água e esgoto passou a três empresas, por um período de 35 anos: a Aegea, a Iguá e a Águas do Brasil, que assume a denominação Águas do Rio no estado de mesmo nome.

Divisão do butim

A Cedae foi então dividida em quatro blocos: o bloco 1, arrematado pelo consórcio Aegea por R$ 8,2 bilhões, com ágio de 103,13% . Reúne a zona sul, o município de São Gonçalo e 16 municípios do interior do Estado.

O bloco 2, que ficou com o consórcio Iguá Projetos por 7,286 bilhões, com ágio de 129,68%, e a Aegea levou também o bloco 4, por R$ 7,203 bilhões e ágio de 187,75% , que abrange bairros do centro e da zona norte e oito municípios da Baixada Fluminense.

O bloco 3, arrematado pelo consórcio Águas do Brasil por R$ 2,2 bilhões, com ágio de 90%, é integrado pelos municípios de Bom Jardim, Bom Jesus do Itabapoana, Carapebus, Carmo, Itaguaí, Itatiaia, Macuco, Natividade, Paracambi, Pinheiral, Piraí, Rio Claro, Rio das Ostras, São Fidélis, São José de Ubá, Sapucaia, Seropédica, Sumidouro, Trajano de Moraes e Vassouras.

Além de bairros da capital, da zona oeste do Rio de Janeiro, como Bangu, Barra de Guaratiba, Campo dos Afonsos, Campo Grande, Cosmos, Deodoro, Gericinó, Guaratiba, Inhoaíba, Jardim Sulacap, Magalhães Bastos, Paciência, Padre Miguel, Pedra de Guaratiba, Realengo, Santa Cruz, Santíssimo, Senador Camará, Senador Vasconcelos, Sepetiba, Vila Kennedy e Vila Militar.

Caixa para campanha eleitoral

Inicialmente, o governador passou a dizer que estava rico. E não era para menos. Foram ao todo R$ 24,889 bilhões que entraram para o caixa do estado. Embora ainda não haja provas para tal, consta que foi com esse dinheiro que ele conseguiu se reeleger governador, fora outras maracutaias.

Só que ao logo de três anos ficou pobre de marré-de-si. No último dia 30 de outubro, o STF realizou uma audiência de conciliação, determinada pelo relator, o ministro Dias Toffoli, após a suspensão da multa da União pela inadimplência de parcelas da dívida do Regime de Recuperação Fiscal, assinado em 2021.

Segundo Castro informou a Toffoli, a dívida do estado com a União subiu 13% entre 2022 e 2023, passando de R$ 138,8 bilhões, para R$ 158,8 bilhões.

Detalhe: o estado do Rio está em Regime de Recuperação Fiscal desde 2017.

E a Águas do Rio é a única das três concessionárias a solicitar aumento de tarifas.

Quem paga o preço

Em meio a todo esse imbróglio, a Águas do Rio - que teve ágio de 90% no leilão de privatização e levou seis meses se preparando para assumir a gestão do que arrematou -, assinou um termo de conciliação com Castro prevendo um aumento na tarifa de 5,18% a partir de 1º de dezembro de 2025 e outro em dezembro de 2026 para os municípios do bloco 1 e 71% do bloco 3, o que inclui a capital. Seria um acréscimo adicional ao reajuste anual baseado na inflação.

O termo também suspende a necessidade de ampliação do abastecimento de água e esgoto até a conclusão da análise da Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio de Janeiro (Agenersa) sobre a proposta de aumento de tarifa. Por que motivo?

Então o estado gasta mal os seus recursos, a Águas do Rio assina um contrato com ágio de 90%, após seis meses de preparação, e só depois descobre que havia algo errado? E somos nós, os consumidores, que pagamos a conta?



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Brizola garantiu o abastecimento da Baixada

Volta e meia Leonel Brizola (1922-2004) fazia uso de sua formação como engenheiro na política. Foi o que aconteceu quando ele foi visitar o Guandu, a grande estação de água construída por Carlos Lacerda para abastecer a cidade do Rio e seus arredores.

O líder trabalhista logo percebeu que o Guandu fora projetado para abastecer apenas bairros da zona sul e a Tijuca, sem levar em conta Itaguaí e Nova Iguaçu: as saídas para as áreas mais pobres ficavam em planos mais altos e só recebiam água depois dos bairros mais ricos. Ainda assim, se o reservatório estivesse bem cheio.

Ou seja: Lacerda discriminou os pobres e Brizola reverteu este processo. “A alternativa era aumentar a quantidade de água tratada, ao mesmo tempo em que se deveria elevar a pressão na adutora da Baixada”, planejou.

No início das negociações para despoluição da Baía de Guanabara, seu governo obteve financiamento para a construção da estação de tratamento de esgotos de Alegria, no Caju, para a qual a Caixa Econômica Federal (CEF) alocou os recursos.

Só que a CEF reverteu as verbas para o projeto Guandu, que absorveu um total de US$ 110 milhões, divididos entre a instituição financeira e o Estado, via Cedae. Assim, passaram a ser enviados mais de 600 milhões de litros de água tratada para dezenas de bairros populares da Baixada, das zonas Oeste e da Leopoldina.

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