RIO

Presidente do bloco 3 vai exigir 15 dias de desconto nas contas da Águas do Rio

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Por CELINA CÔRTES

Publicado em 05/12/2024 às 15:04

Alterado em 05/12/2024 às 21:11

Parece filme de terror. No auge do calor do Rio de Janeiro, com temperaturas passando de 40º, o abastecimento da Águas do Rio permanece deficiente em mais de 20 cidades do estado.

O bairro carioca de Santa Teresa, que fica na extremidade da rede, está sem água há 15 dias.

João Ricardo de Mattos Serafim, o JR, presidente do bloco 3 da privatização – em parte arrematado pela Águas do Rio -, que abrange Santa Cruz, Campo Grande e Seropédica, vai exigir que a concessionária desconte 15 dias na conta dos consumidores finais: “O prejuízo é incalculável”, estima.

“O Hospital do Andaraí ficou sem água e teve de interromper o atendimento de quimioterapia, entre outros. Trabalho na Lapa, onde fica o Inca, uma enorme quantidade de bares e ainda estamos sem água. O Hospital dos Servidores do Estado também interrompeu o atendimento, assim como escolas municipais e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj)”, completa JR, que é diretor de Habitação da Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro.

O problema se espalhou feito rastilho de pólvora pela grande maioria dos bairros e municípios do Estado, como Copacabana, na zona Sul do Rio:

“Essas interrupções frequentes no fornecimento de água têm gerado grandes transtornos aos consumidores, que têm que recorrer à contratação de caminhões pipa que a própria empresa não consegue fornecer”, aponta Horácio Fernandes Magalhães Gomes, da Sociedade Amigos de Copacabana.

“A privatização dos serviços de distribuição e manutenção de água e esgoto trouxe avanços, mas também retrocessos. O atendimento da Águas do Rio é muito melhor que o da Cedae, mas ainda tem muito o que melhorar”, completa.

Para Humberto Lemos, vice-diretor do Sindicato dos Trabalhadores das Empresas de Saneamento e Meio Ambiente, o problema das concessionárias é o baixo piso salarial (R$ 1,5 mil), a grande rotatividade e a falta de pessoal especializado (Leia Box).

Multa do Procon

A Águas do Rio foi multada pelo Procon carioca na última segunda-feira em R$ 13.611.900,00 por ter deixado a população sem água desde a manutenção do sistema Guandu – realizada, com atraso, até hoje não esclarecido – na última terça-feira 26.

A concessionária reagiu com a nota de que havia recebido a notificação do Procon-RJ na sexta-feira 29 e que ainda estaria no prazo “para prestar os esclarecimentos cabíveis”. Que esclarecimento pode justificar deixar a população sem água por tanto tempo no auge do calor?

Já a Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Rio (Agenersa), que estava analisando o acordo de aumento de tarifa feito entre o estado e a Águas do Rio, reagiu com a abertura de um processo regulatório para verificar o cumprimento do prazo para restabelecimento dos serviços, acrescenta, em nota, que “tem cobrado das empresas a adoção de medidas mitigatórias para reduzir o impacto da falta de água”, e ameaça com multa o descumprimento destas ações.

Terça-feira, manifestantes na Avenida Rio Branco, no Centro, protestavam contra a privatização da Cedae e da educação. Já no domingo, moradores de Seropédica e Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, também se manifestaram, na ponte sobre o Rio Guandu – de onde vem a água distribuída no Rio de Janeiro - contra a constante falta d’água nas duas cidades.

Apesar da proximidade com a fonte de abastecimento.

Segunda-feira, foi a vez da população atear fogo em um carro da Águas do Rio durante protesto realizado à noite, em Nova Iguaçu, revoltados com a falta de água que já durava 10 dias.

Ao contrário da promessa de melhorias no fornecimento, o que se vê são constantes rompimentos de adutoras e falta de planejamento na manutenção, acompanhados de falhas de comunicação com os consumidores.

“Estou sem água há oito dias e tenho crianças pequenas. Meu marido vai trabalhar com a roupa suja, meu bebê está com assaduras porque não tenho água para dar banho nele. Quem vai pagar nossos prejuízos com a compra de galões de 20 litros de água?”, diz Isabel Duarte no Seropédica Online, moradora do bairro Campo Lindo.

Donos de caminhões pipa chegaram a cobrar R$ 5 mil por viagem neste período crítico. A secretaria de Defesa do Consumidor se comprometeu a investigar estes casos.

Explosão de adutora causa morte

Como se sabe, o rompimento da adutora de 1,70 m de diâmetro no domingo 24, na Rua das Opalas, em Rocha Miranda, causou a morte de Marilene Rodrigues, de 79 anos. Sua filha de criação, Suelen Belo, conseguiu ser retirada com vida dos escombros.

Foram 13 explosões em 11 meses. Algo que também acontecia com a Cedae, não com tanta frequência. Conforme João Xavier, diretor do Sindicato dos Trabalhadores de Água, Saneamento e Meio Ambiente, foi distribuída no G20 uma carta aberta, denunciando “as calamidades previsíveis pós privatização da Cedae. Só tem piorado. E muito”, lamenta.

Segundo a carta aberta, nos últimos 15 anos 235 cidades de 37 países retornaram o controle público das águas, o que também já aconteceu com 78 municípios do Brasil.



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Não há técnicos capazes de operar as manobras

A grande diferença entre a Cedae e as concessionárias que passaram a gerir o sistema com a privatização é o quadro de profissionais experientes que trabalhavam na estatal, conforme o engenheiro civil Humberto Lemos.

 


Humberto Lemos Foto: divulgação



“É preciso tempo para compreender como funciona o setor de operação e aprender as manobras do grande sistema, formado pelo Guandu, Ribeirão das Lages e represas do sistema Acari. São desempenhos complexos para as adutoras de vários calibres”, explica.

“Cada vez que há uma parada, como ocorre quando se faz a manutenção da rede, as adutoras estão arrebentando porque é preciso saber voltar e eles não estão sabendo voltar por falta de gestores, que dominem o mapa de manobras”, acrescenta.

As ventosas, por exemplo, funcionam para tirar o ar da rede. Se elas não estiverem funcionando corretamente, fazem pressão dentro das tubulações e elas estouram. Também é preciso abrir as descargas, que são registros da tubulação. Elas ficam fechadas quando o sistema está funcionando, e na hora em que for restabelecer é preciso abri-las, porque elas também expulsam o ar e as impurezas.

A explosão que matou uma idosa, em Rocha Miranda, por exemplo, foi uma manobra mal executada.

Segundo Lemos, o prazo para o sistema voltar a funcionar é de 72h. “Eles já estão com 15 dias e não conseguem. Santa Teresa, por exemplo, que fica mais alto, na extremidade da rede, ainda está sem água”, lembra.

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