De profissionais a adolescentes: aprender a costurar está em alta

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Flávia Salme , Jornal do Brasil

RIO - Depois de usarem calças, queimarem sutiãs, tomarem a pílula e conquistarem um lugar ao sol no mercado de trabalho, o que mais poderiam querer algumas mulheres? Aprender a costurar, acredite! Além de carros com perdão da comparação agora chega a vez da mulher total flex: moderna e, por que não, prendada com os melhores atributos de uma dona de casa do tempo da vovó. E, sem qualquer vergonha disso, pelo contrário. De adolescentes à aposentadas, cresce o número de mulheres do século 21 atrás de ateliês e cursos que lhes permitam alinhavar as mais diferentes tramas.

No último dia 17, em Ipanema bairro onde nascem as tendências mais (pós) modernas da cidade foi aberta a Casa Benvida e o seu Café Costura. Simples assim: interessadas em aprender a lidar com moldes, dedais e carretilhas, moças dos mais distintos interesses, idades e profissões, dedicam um dia da semana a aprender a coser bolsas, vestidos e outros retalhos mais.

Na mesa de cortes, nada de senhorinhas, cabelos brancos, avental e óculos na ponta do nariz. A iniciativa é comandada por duas designers que, cansadas da exaustão da rotina de grandes empresas, e da jornada tripla entre filhos e tarefas do lar, resolveram viver daquilo que gostam: uma rotina bem mulherzinha. Ou não.

Tive um aluno que veio fazer o vestido da própria noiva. Ele costurou tudo sem nunca ter pego antes em linha e agulha diverte-se Guaíra de Miranda, 40, uma das sócias e professora do Café Costura.

Estilo vanguarda

A história de Guaíra começou na faculdade de Engenharia, duas décadas atrás. Foi entre os muros da UERJ que ela descobriu o curso de designer. Migrou para na época a mais nova profissão do futuro . Formada, seguiu carreira até parar na MultiRio, empresa municipal com projetos bem moderninhos. Em meio à gerência do departamento de multimeios (cuidava da parte de TV, internet etc...), sentia falta de algum lazer que não fosse só trabalho .

No início eu reunia umas amigas em casa, e as ensinava a costurar. O boca a boca foi trazendo mais pessoas, e precisei alugar uma sala, em Botafogo. Comprava o tecido, mas tive de repassar essa demanda, porque a procura cresceu demais diz.

Com o tempo, Guaíra pensou em fazer do hobby profissão, mas tudo não passava do mundo das ideias. Até ser demitida, em 2005.

Me entreguei totalmente às aulas de costura diz.

Enquanto isso, em São Paulo, a também designer Giselle Barreto, 34, formada pela PUC-RJ, trabalhava intensamente na Editora Abril. Apaixonada por moda, matriculou-se em um curso na capital paulista onde uma professora comentou sobre Guaíra e suas rodas de costura aqui no Rio. Depois de nove anos na terra da garoa, Giselle voltou para o seu lar, e virou assídua no curso da Guaíra.

Tinha largado meu emprego, procurava algo para fazer e me perguntei por que não investir nisso ? Me juntei à Guaíra e abrimos a Casa Benvinda, que é nossa confecção. Mas a procura pelas aulas de costura é grande. Tivemos de deixar a sala em Botafogo e mudar para uma casa mesmo, com mais espaço.

De encontro jovem à terapia em grupo: propostas na medida

Às vésperas de se despedir das aulas no Colégio Corcovado, a estudante Vanessa Schafstein, então com 15 anos, decidiu, com mais quatro amigas, que deveriam fazer alguma atividade em grupo para manter a união. Mediram as propostas, amarram as idéias e arremataram a decisão: iriam aprender a costurar.

Já costuro há dois anos, acho super legal quando alguém fala das peças que produzo empolga-se a jovem, recém-aprovada na faculdade de Moda da Universidade Veiga de Almeida.

A bióloga do Ibama Patrícia Rodin Ben Lior, 31, sempre se interessou por atividades manuais. Mas foi durante a gestação da filha Noa, hoje com um ano e dois meses, que ela resolveu entrar para as aulas de corte e costura.

Uma amiga me indicou. Minha mãe sempre teve máquina, mas nunca me ensinou a costurar. Hoje estou bem animada, ando em shoppings e acho tudo muito padronizado. É bom poder criar aquela peça que você não acha em lugar nenhum garante.

Efeito zen

Em Laranjeiras, a psicanalista Sandra Teixeira encontrou na costura uma alternativa terapêutica que vem dando pano para a manga. Inspirada no filme Colcha de retalhos, dirigido por Jocelyn Moorhouse, Sandra reúne semanalmente um grupo de pessoas que, enquanto compartilham suas histórias e angústias, tecem, claro, uma colcha com sobras de tecido.

É muito gostoso misturar técnicas manuais, como a costura, com a psicanálise, que é algo muito pesado. Deixa a terapia mais lúdica, menos árdua diz Sandra.

Ela tem duas pacientes experts em costura, que repassam as técnicas ao resto do grupo.

Já ensinei a pelo menos cinco pessoas, que queriam aprender para pôr em prática as próprias ideias conta a maquetista Araceli Taveira, 59, que participa do grupo Colcha de Retalho.