História, uma grande mestra
Acompanho, pelo noticiário, a eterna luta das autoridades municipais para coibir o estacionamento indevido. Ele é o fruto natural da falta de planejamento para dotar a cidade de vagas suficientes, principalmente para as atividades de lazer, destacando-se a ida à praia, durante o verão.
A história desta luta desigual vem de longa data. Antes do aumento de frota nacional de automóveis, advindo da indústria automobilística nacional, onde havia a punição, por remoção, apresentava a advertência “sujeito a reboque”. Os abusos desta infração forçaram o diretor Menezes Cortes a esvaziar um pneu, durante a Copa de 50, no entorno do Maracanã. O coronel Fontenelle também fez a sua marca registrada com a punição, em quaisquer condições, do esvaziamento dos quatro pneus, no início da década de 60. Tudo isto ocorria pela deficiência dos meios que a lei dava ao administrador.
Na minha gestão, nos últimos anos da década de 60, iniciamos tentando minorar o déficit de vagas, estabelecendo uma comissão de alto nível para elaborar um plano de estacionamento. Desta comissão resultou o estacionamento rotativo controlado pelo disco, hoje por talão, que copiamos de Israel, na nossa segunda gestão, em 1975, e a regulamentação do estacionamento, sobre a calçada, nos recuos dos prédios, para os moradores do mesmo, comprovado com a conta de luz no para-brisa. Como resultado maior, o projeto de uma rede de garagens subterrâneas, sob as praças, de preferência. Desta iniciativa só se construiu o Edifício-Garagem Menezes Cortes. Como medida coercitiva, criamos a Operação Gato e Rato, na qual o motorista era o rato Jerry e o Detran, o gato Tom. Era o nosso reconhecimento de que jamais levaríamos a melhor. Inventamos uma carta de repreensão, em tamanho de folha A1, a ser colada nos para-brisas obstruindo a visão do motorista, como aviso para ser rebocado pelos reboques que circulavam por vias previamente divulgadas pelos jornais, de acordo com o roteiro de sua ação. O nosso propósito, ciente de que a multa em excesso reflete o fracasso de administração, era desobstruir os eixos principais e coibir o estacionamento debochado sobre o passeio.
Quando, em 1969, ao regressar de um estágio no Detran de Nova York, tentei introduzir aqui, a exemplo do que vi lá, o Ignition control unit, instrumento de controle em que se aproveitavam antigos puxadores, regenerados, para remover o carro, utilizando um dispositivo para a ligação direta que dava o nome ao grupo de arrombadores profissionais. Quase fui linchado pela opinião pública..O sistema agilizaria, como em NY, a ação do gato Tom. O escalonamento dos preços do estacionamento, junto às praias, com preços tanto mais altos quanto mais perto do mar, melhoraria de muito em alguns locais (Ipanema, Leblon, Copacabana, Jardim Oceânico na Barra), desde que bem operado.
Disto tudo que aqui foi mostrado, ficam evidentes a fraqueza do rigor da lei e a falta de um planejamento que tenha um objetivo concreto e construtivo.Tivéssemos, de fato, no Rio, um Cetran competente, ativo e atento, já deveria ter sido proposta, como infração ao Código, a ressurreição da “incontinência pública”, existente no Código anterior ao atual, que permitia, ao infrator, ter a sua habilitação suspensa pelo tempo que a autoridade de trânsito estipulasse. Bastaria, como já cansei de sugerir, plaquear a exemplo do que se fazia outrora, quando a infração ao estacionamento proibido fosse assim considerada, por despacho judicial, com aviso “Sujeito à incontinência pública”. Agilizaria a punição, muito mais rápida do que a remoção e de enorme eficácia pelo medo do rigor da mesma. Só existe um obstáculo irremovível para a sua implantação: não dará o lucro que a Operação Reboque discricionária, em alguns casos até sem lógica, hoje em vigor, sob o apelido de “choque de ordem”, incapaz de fazer jus ao seu título que, segundo o noticiário, na coibição do estacionamento ilegal, pouco tem adiantado.
Celso Franco, oficial de Marinha reformado (comandante), foi diretor de Trânsito do antigo estado da Guanabara e presidente da CET-Rio. - acfrando@globo.com